Caso Varzim – Trofense

Varzim-TrofenseRepeticao(A 3 de Setembro de 1993, o ‘Record’ noticiava assim a falta de comparência do Trofense ao jogo da Póvoa.)

O futebol português tem uma história recheada de “casos” que, infelizmente, em nada dignificam um País que possui tanta tradição na modalidade a nível Mundial.

Hoje, decidi recuperar um desses casos. Um caso que, provavelmente, muita gente se vai voltar a recordar, e que outra, certamente, não se recorda, nem faz ideia.

O caso remonta a 1993 e envolveu, principalmente, Varzim e Trofense, mas, também, o Valpaços, que desistiu, perto do final de 92/93, de participar na Zona Norte da II Divisão B e despoletou, sem intenção, um caso que se arrastou até ao início da época 93/94.

A história começa precisamente pela equipa transmontana que, como disse, optou por não terminar a temporada e desistiu da competição a poucas jornadas do fim. A Federação Portuguesa de Futebol, perante este cenário, decidiu anular todos os jogos feitos pelo Valpaços até então, e, como é lógico, quem tinha pontuado perante os valpacenses, ficou desde logo prejudicado na tabela classificativa com uns pontos a menos.

Ora, o último jogo do Valpaços remonta à 30ª Jornada, a quatro jogos do final do campeonato, numa receção ao Maia, que terminou com triunfo maiato por 3-1.
Precisamente nessa jornada, o Varzim recebe o Trofense, mas é obrigado a fazê-lo no Marco de Canaveses, em virtude do seu estádio estar interditado.
O jogo disputa-se normalmente e o Trofense acaba por vencer por uma bola a zero, com o golo a ser apontado por um “miúdo” de 17 anos chamado Tiago, que, anos mais tarde, viria a ser jogador de, entre outros clubes, Benfica, FC Porto e Boavista.

Por isso, com a desistência dos transmontanos e a anulação dos trinta jogos que haviam feito, muitas equipas saíram naturalmente prejudicadas, com o Trofense logo à cabeça, até porque seria o adversário do Valpaços na jornada imediatamente a seguir.

O Varzim, registe-se, tinha recorrido do facto de ter de receber o Trofense em campo neutro, mas, a FPF não foi célere a resolver o caso, e este arrastou-se até ao final da temporada, sendo que os poveiros terminaram mesmo o campeonato em posição de descida e estavam, por isso, pendentes da resolução do processo.

Varzim0-1Trofense9293(A ficha do ‘original’ Varzim 0-1 Trofense de 92/93.)

Já depois do campeonato terminar, a FPF decide dar razão ao Varzim, anula o castigo anterior e manda repetir o jogo na Póvoa.
Com a anulação do castigo, o jogo disputado entre Varzim e Trofense em campo neutro, ficou, também ele, sem efeito, pelo que as duas equipas passaram a estar igualadas com 27 pontos na tabela. Ou seja, a repetição do jogo iria determinar que uma destas equipas descesse à III Divisão Nacional.
O Trofense recusa-se, desde o primeiro momento, a repetir o encontro, alegando que nada tinha a ver com o caso  e recorre da decisão, fazendo com que o processo se prolongue no tempo.

A última decisão da FPF é favorável ao Varzim, tendo em conta que o órgão federativo ordena mesmo que o jogo se repita, imagine-se, a 2 de Setembro de 1993, já dentro da temporada 1993/1994, altura em que os campeonatos nacionais estavam prestes a ter início, o que obrigaria, desde logo, a que pelo menos um jogo da primeira jornada da Zona Norte da II Divisão B e um jogo da primeira jornada da Série B da III Divisão Nacional fossem adiados.

No meio de tudo isto, a população da Trofa iniciou uma onda de protestos e revolta, que começou com o corte da Estrada Nacional 14; organizou manifestações em frente à Associação de Futebol do Porto e em frente à Federação Portuguesa de Futebol; e acabou com um rasto de destruição pelas ruas da Trofa, que rapidamente evoluíram para graves confrontos com a GNR local durante algumas noites.

Entre as várias assembleias extraordinárias do CD Trofense que se realizaram nesse período, os sócios foram chamados a decidir a comparência ou não da equipa ao jogo, e o “não” foi esmagador: 546 sócios votaram que o clube não devia comparecer na Póvoa, e 108 acharam que o jogo se deveria realizar.

Portanto, no dia marcado para a repetição do jogo, 2 de Setembro de 1993, apresentaram-se apenas duas equipas no Estádio do Varzim: a equipa da casa e a equipa de arbitragem chefiada por Carlos Valente. Do Trofense, nem sinal, como já havia sido previamente anunciado. A FPF homologou o jogo com um 3-0 favorável aos poveiros e atirou, assim, com o emblema da Trofa para a III Divisão.

Com toda esta confusão, os habitantes da Trofa chegaram mesmo a colocar em causa a continuidade do clube, mas, felizmente, o Trofense prosseguiu o seu caminho, e, como se sabe, até já marcou presença na I Liga por uma ocasião – 2008/2009.

Este é um dos muitos casos que o futebol português tem guardados naquela “gaveta” que não convém ser aberta, mas que, de vez em quando, nós temos que os lembrar.

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