Fábio Silva: o maior artilheiro português na Europa

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Fábio Silva, ponta de lança que representa os neerlandeses do PSV Eindhoven, é o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

Dada a paragem dos campeonatos para os compromissos de selecções, excepcionalmente não será feito um destaque semanal, mas sim um de balanço de temporada até ao momento. E, olhando para os números registados até esta fase da época, um dado salta à vista: nenhum português marca mais golos na Europa em 2022/23 do que Fábio Silva.

São 15 os tentos já festejados pelo avançado nascido no Porto na temporada em curso, divididos pelo Anderlecht (11) e pelo PSV Eindhoven (4). Reduzindo a análise a golos apontados no campeonato, Fábio Silva é igualmente o maior artilheiro português no continente europeu, com 7 golos na Liga belga e 3 nos Países Baixos, para onde se mudou no fim do mercado de inverno.

É, assim, uma época de afirmação individual para um avançado que passou por momentos difíceis com as duas temporadas em Inglaterra, ao serviço do Wolverhampton: se na primeira, ainda com idade de júnior, conseguiu marcar 4 golos em 36 partidas sob o comando de Nuno Espírito Santo, já na segunda, com Bruno Lage ao leme, ficou em branco nos 26 jogos que disputou.

Desde muito jovem apontado como uma promessa gigante do futebol nacional, Fábio Silva, filho de Jorge Silva (antigo internacional português e uma figura do Boavista), somou registos goleadores absolutamente incríveis no percurso formativo, iniciado no Nogueirense e com passagem pelo Gondomar antes de chegar ao Porto ainda com 8 anos. Faria 7 temporadas nas escolas portistas, apenas com interregno dos 2 anos de iniciado em que jogou no Benfica, destacando-se a época 2018/19, na qual apontou 33 golos – 5 dos quais na caminhada na UEFA Youth League que terminou com a conquista da prova por parte dos dragões, batendo o Chelsea na final (3-1).

No início dessa temporada, tinha celebrado contrato profissional com o Porto válido até 2021 e com cláusula de rescisão de 10 milhões de euros (que a partir de 2020 passava a 50 milhões); no fim, renovou por mais um ano, numa altura em que foi apontado pela UEFA como uma das 50 “estrelas do futuro” do futebol europeu. Acabaria, inevitavelmente, por ascender ao plantel principal, apesar de ter apenas 17 anos, e foi com a idade de júnior de primeiro ano que se tornou no mais jovem de sempre a actuar (e também a marcar) pela equipa principal dos dragões.

No fim de 2019, após ser eleito o “Atleta Revelação” do clube nesse ano, o próprio presidente do Porto, Pinto da Costa, anunciou mais uma renovação do contrato com o jovem atacante, que ficou então blindado por uma cláusula de rescisão astronómica (125 milhões de euros!) com o compromisso de assinar até 2025 assim que completasse os 18 anos, como mandam as regras da FIFA. Essa prometida renovação, contudo, não chegaria a acontecer: no mercado de verão de 2020 (alargado devido à pandemia do coronavírus), e depois de apenas uma época na equipa principal do Porto, com totais de 21 jogos e 3 golos e a conquista do campeonato e da Taça de Portugal, Fábio Silva transferiu-se para o Wolverhampton a troco de 40 milhões de euros, no que foi na altura o mais alto valor de sempre pago pelo clube inglês numa contratação.

No Wolves, continuou a bater recordes relacionados com a idade – tornou-se, por exemplo, no mais jovem português de sempre a marcar na Premier League, superando um tal de Cristiano Ronaldo, e também no mais jovem de sempre a marcar pelo clube no principal escalão do futebol inglês –, foi eleito o Jovem do Ano e considerado pelo seu presidente o “melhor jogador do mundo na sua faixa etária” no fim da primeira temporada. A segunda, porém, já não viria a correr de feição, e no passado verão, no dia em que celebrou o 20º aniversário, Fábio Silva acabou por rumar ao Anderlecht (mas não sem antes renovar com o Wolverhampton até 2026, numa demonstração clara de que o emblema inglês continua a acreditar no potencial do jovem avançado luso).

Na Bélgica, Fábio Silva reencontrou-se com os golos, mas a prestação colectiva abaixo das expectativas (mergulhado na segunda metade da tabela e já eliminado da Taça em Dezembro) e o desagrado pela ideia de jogo preconizada pelo treinador Brian Riemer (o terceiro da temporada) levaram-no a optar por procurar outra realidade para a segunda metade da época. Surgiu então a hipótese de seguir para o PSV Eindhoven, treinado por Ruud van Nistelrooy, uma lenda goleadora, e o avançado luso nem pestanejou, acabando por ganhar um lugar no 11 titular após 6 participações como suplente utilizado, contando agora já com 5 jogos consecutivos como opção inicial no emblema que caiu da Liga Europa no play-off diante do Sevilla mas que mantém vivas as aspirações no campeonato (terceiro, a 8 pontos do líder Feyenoord) e na Taça (vai defrontar nas meias-finais o surpreendente Spakenburg, do terceiro escalão).

É verdade: apesar de já se ouvir falar nele desde o que parece uma eternidade, Fábio Silva ainda só tem 20 anos e continua, obviamente, a ser uma das maiores promessas do futebol português. E até os traços de personalidade que demonstra em intervenções públicas demonstram um nível de maturidade pouco comum – já deixou bem claro em inúmeras ocasiões, por exemplo, lidar bem com o valor da transferência para o Wolverhampton ou com séries de jogos sem marcar. “Isso passa-me ao lado. Preocupo-me em viver o dia-a-dia, focar-me no treino e ajudar a equipa. O meu contributo vai para lá dos golos, passa pelas movimentações, pela ajuda defensiva e ofensiva, etc. No final, juntando tudo, estou mais perto de fazer golos”, dizia em Setembro na concentração da selecção de sub-21, patamar no qual soma 8 internacionalizações e 6 golos (de um total de 49/23 em todos os escalões desde os sub-15, com participações em dois Europeus de sub-17).

Na calha estará, até por esse passado nas selecções, uma eventual chamada para a selecção principal, numa altura em que se inicia um novo ciclo… embora com Cristiano Ronaldo ainda presente. Como revelou em 2020, Fábio Silva (que tem como grande referência para o seu jogo Falcao, outro antigo avançado do Porto) tem o sonho de fazer dupla com o CR7 no ataque da selecção, mas as ambições vão mais além. “O meu objectivo é tornar-me um dos melhores do mundo na minha posição. Em termos individuais, gostava da Bola de Ouro ou da Bota de Ouro. Em termos colectivos gostava de ganhar a Liga dos Campeões. É linda a competição e é o que todos ambicionam”, confessou em tempos, garantindo ter ainda outro desejo: regressar um dia ao Porto, o “clube do coração”, para “fazer nos seniores o mesmo da formação”. Ou seja, golos; muitos golos.

Xeka: o “outro” português que dá vida ao meio-campo do Lille

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Xeka, médio que representa o Lille, é o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

Muitos são os motivos para que Renato Sanches seja o nome mais mediático do meio-campo do Lille – tantos que nem vale a pena perder tempo a enumerá-los neste artigo. O (ainda) campeão francês em título, porém, tem no seu plantel outro português que pisa terrenos semelhantes… e há bem mais tempo que o campeão europeu de 2016: falamos de Xeka, que actua nos Dogues desde o inverno de 2017 e que no passado fim-de-semana transformou esta na temporada mais profícua da carreira em termos de golos ao dar a vitória ao Lille na visita ao reduto do Montpellier (0-1).

Este foi o terceiro tento da época para o médio nascido em Paredes há 27 anos. Até aqui, o seu máximo de golos numa temporada havia sido 2 – tal aconteceu em 2017/18, quando alinhou pelo Dijon por empréstimo do Lille, e depois em 2018/19 e 2020/21 já de volta aos Lillois. O mais importante de todos, porém, terá sido mesmo o que marcou no primeiro jogo oficial da presente época, que valeu a conquista inédita da Supertaça francesa diante do PSG (também 1-0), fazendo em Dezembro o segundo da temporada – então a abrir o marcador na vitória por 2-1 em casa do Rennes, com o outro tento da sua equipa a pertencer a… Renato Sanches.

Xeka, já se disse, é o português que há mais tempo figura nos quadros do Lille; integra, de resto, a hierarquia dos capitães, ainda que na mesma esteja atrás de José Fonte, contratado no verão de 2018. Por essa altura, Xeka estava a regressar ao clube após a tal cedência de uma época ao Dijon, na qual ganhou o ritmo e a preponderância que não havia conseguido obter no primeiro ano em França – ainda que tenha feito o suficiente para garantir a contratação permanente no fim de 2016/17, a troco de cinco milhões de euros, depois de 15 jogos e 1 golo alcançados no período em que se encontrava cedido pelo Braga.

A ascensão do médio luso a partir do momento em que chegou à equipa principal dos bracarenses, de resto, foi meteórica. Com a maioria do percurso de formação dividido entre Paços de Ferreira e Gondomar, Xeka transferiu-se no primeiro ano de júnior para os espanhóis do Valencia mas depressa regressaria a Paços; ao chegar à idade sénior (2013/14) mudou-se para o Braga, integrando a equipa B (então na II Liga), e nas duas épocas seguintes actuou no Covilhã por empréstimo dos Guerreiros do Minho, dando especialmente nas vistas na segunda (35 partidas disputadas).

Começaria 2016/17 ainda com estatuto de jogador de II Liga, cumprindo 11 partidas pela equipa B do Braga naquele escalão, mas em Outubro estreou-se pela formação principal e não mais de lá saiu, tornando-se de imediato titular indiscutível quer com José Peseiro, quer depois sob o comando de Jorge Simão. E de repente, no último dia do mercado de inverno deu-se a mudança para o Lille, primeiro por empréstimo e depois tornada definitiva no final da temporada. Xeka passaria então por um período de adaptação ao futebol francês que incluiu a tal cedência ao Dijon, mas a partir de 2018/19 tornou-se um indiscutível na equipa, ainda que alternando a titularidade com o banco: 30 jogos nessa época, tendo falhado os últimos dois meses por lesão; 25 partidas na seguinte, encurtada devido ao surgimento da pandemia do coronavírus; e 42 jogos em 2020/21, 20 dos quais como titular na época que terminou em celebração com a surpreendente conquista do campeonato francês.

2021/22, por seu lado, até nem começou de forma positiva devido a um acontecimento… caricato: ainda na pré-temporada, Xeka e o compatriota Tiago Djaló desentenderam-se durante a primeira parte de uma partida frente aos belgas do Kortrijk e quase chegaram a vias de facto, sendo ambos expulsos pelo árbitro do encontro. Os ânimos entre os colegas acalmaram entretanto e para Xeka estaria então reservada a glória do golo vitorioso no primeiro jogo oficial da temporada, a Supertaça, assumindo a titularidade no meio-campo dos Dogues até meio de Dezembro.

Na fase final de 2021 perdeu lugar no 11, somando três aparições como suplente utilizado e acabando mesmo por não sair do banco em duas ocasiões – a última das quais já neste mês de Fevereiro, na dolorosa goleada caseira de 5-1 sofrida ante o PSG. Na ronda seguinte, porém, voltou a ser opção inicial e recompensou a opção do técnico Jocelyn Gourvennec com o golo que ditou o resultado em Montpellier, tendo entretanto feito também os 90 minutos no nulo caseiro contra o Metz jogado esta sexta-feira.

Xeka, refira-se, termina a sua ligação contratual com o Lille neste verão, pelo que neste momento é livre de decidir onde irá jogar na próxima temporada, e não custa acreditar que já esteja a ouvir propostas, sendo um alvo claramente apetecível. Aos 27 anos, espera-se que o médio de Paredes dê um passo, seja ele qual for, que pelo menos o mantenha no patamar onde está neste momento – apesar do Lille estar a fazer um campeonato bastante abaixo das expectativas (nono classificado, ainda que a apenas dois pontos dos lugares europeus e a seis das posições de acesso à Liga dos Campeões da próxima temporada), mantém-se na Liga dos Campeões, indo enfrentar precisamente o campeão em título, Chelsea, nos oitavos-de-final; só assim poderá, de resto, continuar a acalentar o sonho de chegar à selecção nacional, ele que soma apenas uma internacionalização em toda a carreira, nos sub-20, apesar de nas últimas três épocas ter, em determinados momentos, estado a um nível até superior ao seu compatriota e colega de sector… que raramente deixou de ser convocado por Fernando Santos.

Gondomar: no quarto escalão 21 anos depois

Gondomar(Gondomar vai continuar no Campeonato de Portugal. Créditos de imagem: facebook do Gondomar SC.)

Em 2000, o Gondomar fechou a Série B da antiga III Divisão no 2º lugar e garantiu a subida à II Divisão B, dando início a um ciclo de mais de 20 anos sem cair no quarto escalão, o que não evitou esta temporada, falhada que foi a promoção à III Liga.
O emblema azul e amarelo lutou até ao fim da fase regular pelo 1º lugar da Série C, chegou a estar mais de quatro meses sem perder, mas o mau arranque na fase de acesso à futura Liga 3, ditou a permanência dos gondomarenses no Campeonato de Portugal, que passará a ser, como se sabe, a quarta divisão portuguesa.
Numa série que perdeu pelo caminho Câmara de Lobos e União da Madeira, o Gondomar arrancou bem, com duas vitórias em três jornadas, contudo, logo depois, esteve três jogos sem vencer (duas derrotas e um empate) que antecederam o tal período invencível: foram dez partidas, entre Novembro e Abril, nas quais os comandados de Américo Soares somaram oito triunfos e dois empates.
A dois jogos do fim, a fase de subida à II Liga era um objetivo bem real para os nortenhos, porém, duas derrotas ditaram o 3º lugar final na Série C, com 34 pontos (os mesmos do Leça que foi 2º), resultantes de dez vitórias, quatro empates e quatro derrotas em dezoito jogos, e com um saldo claramente positivo de golos: vinte e seis marcados contra treze sofridos.
Na luta por um lugar na III Liga, o Gondomar ficou na Série 3 junto de Leça, Sanjoanense e São João de Vêr, e ao empate na ronda inaugural diante dos feirenses (0-0), seguiram-se três derrotas que ditaram o destino dos azuis e amarelos, que não foram além do 4º e último lugar do grupo, com 5 pontos, fruto de um triunfo, dois empates e três desaires em seis encontros, com quatro golos apontandos e seis consentidos.
Clube que se afirmou, na última década, no terceiro escalão do nosso futebol, o Gondomar viveu o seu melhor período entre 2004 e 2009, quando esteve cinco temporadas consecutivas na II Liga, isto já depois de em Novembro de 2002, então a jogar na Zona Norte da II Divisão B, ter ido ao antigo Estádio da Luz eliminar o Benfica (1-0) da Taça de Portugal com um golo de Cílio Souza.

Castro: lutar até à exaustão para quebrar todos os paradigmas

castrobraga(Castro foi fundamental no SC Braga desta temporada.)

A época do Braga de Carlos Carvalhal versão 2.0, de altos e baixos mas no fim considerada positiva devido à tão ansiada conquista da Taça de Portugal, contou com vários protagonistas que ao longo da temporada foram sendo justamente reconhecidos pela opinião pública – do guarda-redes Matheus aos virtuosos Piazón e Gaitán, dos alas Esgaio e Sequeira ao tampão Al Musrati e ao capitão Fransérgio, da segurança defensiva oferecida por Raul Silva e Tormena à imprevisibilidade de Galeno e Iuri Medeiros ou aos golos de Ricardo Horta e Paulinho/Abel Ruiz. No meio de todo este belíssimo conjunto de atletas, um jogador é, na minha opinião, sistematicamente esquecido: Castro. E é para reparar essa injustiça que este texto tem a sua razão de existir.

André de Castro Pereira não é o jogador mais habilidoso, não é portentoso do ponto de vista técnico, não é o mais veloz ou atemorizador em termos físicos para quem olhe de relance pela primeira vez. Tem, contudo, um atributo que o distingue de todos os outros jogadores que com ele partilham o campo: uma alma do tamanho do mundo, que o torna um atleta assustadoramente competitivo e capaz de correr quilómetros atrás de quilómetros sempre com a mesma rotação. A garra, o empenho, o compromisso, a dedicação com que enfrenta cada jogo, com que disputa cada lance, fazem de Castro um elemento absolutamente imprescindível para qualquer treinador – e assim aconteceu em todas as temporadas da sua carreira sénior… à excepção do dois anos e meio em que integrou o plantel da equipa principal do “seu” Porto.

castrofcp(Entre formação e equipa principal, Castro cumpriu dez épocas e meia ao serviço do FC Porto, tendo conquistado 3 Campeonatos, 1 Taça de Portugal, 1 Supertaça e 1 Liga Europa.)

De formação quase integral de dragão ao peito (excepção feita aos primeiros anos de futebol federado, passados no Gondomar da sua terra natal), e sendo bisneto de uma antiga glória portista (Francisco Castro, internacional A por Portugal na década de 30 do século passado), Castro foi sempre visto como uma das grandes promessas das escolas azuis-e-brancas. Convocado pela primeira vez para um jogo da equipa principal 4 dias após fazer 19 anos, em 2006/07 por Jesualdo Ferreira (num jogo com o Vitória de Setúbal onde acabaria por não sair do banco), o jovem médio viria a integrar o plantel na temporada seguinte e aí sim fez os primeiros 3 jogos, sagrando-se campeão nacional; a concorrência feroz, porém (na sua posição havia “só” nomes como Paulo Assunção, Fernando, Lucho González, Raul Meireles ou Fredy Guarín), levou-o a aceitar o desafio de ser emprestado em 2008/09 a um clube da II Liga, no caso o Olhanense, onde seria treinado pelo antigo capitão portista Jorge Costa.

A decisão dificilmente poderia ter sido mais acertada: o emblema algarvio sagrou-se campeão logo nesse ano, ascendendo à I Liga pela primeira vez em quase 40 anos, e na temporada seguinte alcançou a permanência com um plantel recheado de juventude e onde Castro, juntamente com outras crias dos dragões (como Ukra, Zequinha, Tengarrinha ou Ventura), assumiram papel preponderante. Uma grande temporada que valeu ao médio o regresso ao plantel portista, agora sob o comando de André Villas-Boas mas onde acabaria novamente por não conseguir furar: apenas 6 jogos até Janeiro, um dos quais na Liga Europa que a equipa viria a conquistar em Maio, e que motivou nova cedência, esta válida por ano e meio para os espanhóis do Gijón, onde depressa conquistaria um lugar no onze inicial, e logo na primeira época muito contribuiu para uma histórica vitória no Santiago Bernábeu, diante do Real Madrid (1-0), num triunfo que terminou com a invencibilidade caseira das equipas às ordens de Mourinho, algo que já durava desde 2002.

castroolhanense(Castro alinhou duas épocas pelo Olhanense, ajudando os algarvios a regressar, em 2009, à I Liga, após uma ausência de 34 anos.) 

Seria em 2012/13, já com Vítor Pereira ao leme da nau azul-e-branca, que viria a ter mais oportunidades na equipa principal do Porto… mas ainda assim bastante escassas: 25 partidas disputadas (e 1 golo), mas apenas 5 delas como titular e todas nas Taças. Na época seguinte, com a chegada de Paulo Fonseca ao Dragão, Castro cedo percebeu que dificilmente viria a conseguir conquistar em pleno um lugar na sua equipa do coração, e optou por partir à aventura e rumou à Turquia, assinando pelo modesto Kasimpasa – primeiro por empréstimo dos dragões mas um ano depois em definitivo. “Este foi um ano de transição na minha carreira, foi um ano em que decidi pensar em mim, porque estar sempre a ser emprestado já não era normal e chegar aos 26 anos e ser novamente cedido ainda menos”, disse então em entrevista ao jornal O JOGO.

E o que é facto é que Castro se tornou uma lenda no futebol turco – é ainda hoje o estrangeiro com mais jogos quer no Kasimpasa (138 entre 2013 e 2017), quer no Goztepe (101 entre 2017 e 2020). E foi precisamente em Julho do último ano, no momento em que se despediu da Turquia, que o médio gondomarense começou a romper com um paradigma que há vários anos persegue todos os jogadores conceituados que regressam a Portugal já “veteranos” – que é como quem diz, com mais de 30 anos (Castro tinha 32 por essa altura): a impossibilidade de voltar a um clube “grande”, que lute por títulos. Os exemplos disso são inúmeros e podem ser vistos em quase todas as temporadas, com atletas que vêm de contextos bastante competitivos, muitos até com o estatuto de campeões nacionais nos países de proveniência e até com jogos nas competições europeias, e que só encontram abertas as portas de emblemas de objectivos mais modestos ou até de divisões inferiores.

castrokasimpasa(O Kasimpasa foi quem abriu as portas da Turquia a Castro, em 2013, e em quatro temporadas o médio luso tornou-se no estrangeiro com mais jogos pelos azuis, recorde que ainda hoje persiste.)

Assim que foi oficializada a sua contratação por parte do Braga, as vozes do costume ergueram-se a frisar precisamente isso: o jogador era um trintão que tinha passado sete anos em clubes de meio da tabela da Liga turca, e como tal não poderia ser visto como um verdadeiro reforço para um clube da dimensão dos Guerreiros do Minho. Pois bem: Castro quebrou todos os estigmas, foi titular em 30 das 33 partidas em que alinhou pelos bracarenses (com 2 golos marcados, um deles logo na estreia e em pleno Estádio do Dragão diante do Porto), sendo peça absolutamente fulcral no sistema de Carlos Carvalhal e nas caminhadas rumo às finais da Taça da Liga (perdida por 1-0 ante o Sporting) e da Taça de Portugal (que ganhou pela segunda vez na carreira depois de 2010/11, sendo desta feita titular absoluto inclusive na final com o Benfica).

Da minha parte, desejo e espero que o exemplo de Castro abra um novo precedente no futebol português e que os clubes comecem a confiar mais no talento dos atletas lusos que andam por esse mundo fora a representar Portugal. Ninguém perde capacidades por estar muito tempo longe do nosso futebol – pelo contrário, a tendência é exactamente a oposta – e principalmente nos dias de hoje nenhum atleta é velho só por ter passado a barreira dos 30 anos – basta olhar para os exemplos de Cristiano Ronaldo, Lewandowski, Messi, Zlatan Ibrahimovic e tantos outros futebolistas que continuam a estar no topo do futebol mundial e já há muito passaram essa barreira. Todos teríamos a ganhar com essa mudança de mentalidade; fica o desafio.

*Artigo redigido por Bruno Venâncio, jornalista com passagens pelos jornais “OJOGO”, “Sol” e “I”.

João Pedro: “Boavista foi uma escola de vida”

É difícil não associarmos João Pedro ao Boavista: com uma formação 100% cumprida nos axadrezados, por quem foi Campeão Nacional de Juniores, o médio defensivo foi lançado por Jaime Pacheco na I Liga em 2005.
Apesar da grande ligação aos boavisteiros, o médio acabou por nunca ser uma aposta efetiva do clube, e, em quatro anos, foi três vezes emprestado: Ermesinde, Beira-Mar e União de Lamas.
O Chipre foi o único País estrangeiro onde se aventurou, tendo representado ASIL, Digenis e Doxa, por quem foi Campeão da II Liga, além de ter passado por Gondomar e Cinfães, ambos no terceiro escalão do nosso futebol.
Esta época, seis anos depois de ter deixado de jogar devido a uma lesão grave num pé, João Pedro voltou aos relvados para representar o Alfenense dos Distritais da AF Porto.
Aos 36 anos, o médio que representou Portugal no Europeu de Sub-19 em 2003, concedeu uma entrevista ao nosso blog onde revisitou toda a sua carreira:

Conversas Redondas: Em 2014, depois de fazer 5 jogos pelo Cinfães no Campeonato de Portugal, deixou de jogar futebol com 29 anos. Porquê?
João Pedro: Na minha última passagem pelo Chipre, em 11/12, tive uma entorse, que é uma lesão simples de curar, normalíssima de acontecer no futebol, mas como estávamos numa fase importante do campeonato, em que já tinhamos subido mas queríamos ser Campeões, eu parei só uma semana e na seguinte fiz tratamento e voltei a treinar, com muitas dores, para poder jogar contra o nosso adversário direto na luta pelo título. Entretanto a época acabou, eu voltei para Portugal para me tratar e ao fim de um mês, dois meses, parecia que não tinha melhorias. Achava estranho tanto tempo para curar uma entorse. Estive ano e meio sem jogar e, nesse período, fui a várias consultas, em que numa das quais, no Hospital da Prelada, no Porto, expliquei ao médico o que tinha acontecido, que já tinha feito, inclusive, três infiltrações e a última correu mal porque queimou-me dois nervos no pé, e questionei-o se podia fazer uma atroscopia para limpar o pé, ao que ele me responde: “João, posso fazer isso, mas se te acertar onde não devo, corres o risco de ficar sem pé”. Aí, cumprimentei-o, agradeci-lhe e vim-me embora. Depois disso surgiu o Cinfães, decidi arriscar e ainda fiz alguns jogos, mas vi mesmo que não valia a pena continuar e tive de mudar de vida. 

CR: Mas esta temporada, depois de alguns anos parado, voltou ao futebol para jogar no Alfenense. O que o motivou a regressar logo num período tão difícil como aquele em que vivemos de há um ano para cá?
João Pedro: A motivação, muito sinceramente, não era muita porque tinha deixado pelos motivos que deixei e já me tinha “desligado” da ideia de ser jogador de futebol. Aliás, quando o Rui, que é o treinador e é um amigo de longa data de quem já fui adjunto, me ligou, pensei mesmo que era para essa função que ele me estava a convidar. Mas ele sugeriu-me jogar, que a este nível chegava perfeitamente, e eu não queria porque tenho a minha filha comigo semana sim semana não, e ia perder muitos momentos com ela, como jantar três vezes por semana mais o almoço em dia de jogo, por exemplo, e isso custa-me. É a pessoa mais importante que tenho na vida e por ela eu não queria voltar. Acabei por falar com ela, ela pensou, e quando digo que pensou acaba por ser engraçado porque pensou mesmo (risos), e disse-me para eu jogar. Pelo meio, o meu irmão, que também conhece o treinador, ligou-me, deu-me outras perspetivas da situação e eu acabei por aceitar. A lesão está cá mas dá perfeitamente para jogar, não me limita a 100%. E, de certa forma, o treino é algo que me ajuda a desanuviar do dia a dia.

CR: O Alfenense disputa a Divisão de Honra da AF Porto, que é o segundo escalão Distrital, e ocupa, neste momento, o 5º lugar com 24 pontos. Quais são os objetivos?
JP: O objetivo é irmos ganhando jogo a jogo para andarmos sempre nos primeiros lugares e na fase final da época logo vermos como estamos e o que podemos fazer. Há equipas com orçamentos superiores e que querem subir, mas como eu costumo dizer no balneário, os orçamentos não ganham jogos e a este nível muito menos. Começámos bem, andámos nos primeiros lugares no começo do campeonato mas depois defrontámos adversários diretos e acabámos por perder não digo que tenha sido por falta de qualidade ou de entrega, mas sim por pequenos pormenores, talvez sinal de imaturidade porque temos uma equipa muito jovem, que nos custaram “caro”. Por vezes queremos jogar, queremos manter o nosso estilo de jogo, e as ideias e os processos estão lá, mas nestes campeonatos isso é difícil e já nos custou muitos pontos, porque há momentos em que temos de ser mais agressivos e não somos. Mas como digo a eles, só erra quem está lá dentro.

148283562_518476062464322_1911973747161993452_n(João Pedro, atrás, observa o duelo entre Luís Vouzela e Cadinha durante o Beira-Mar – Ovarense da II Liga 05/06.)

CR: E quais são os objetivos do João?
JP: Eu, acima de tudo, quero é que o clube cresça e ganhe para a mentalidade mudar e começar a subir patamares mas sem dar “passos maiores do que a perna”. Pediram-me para, dentro da experiência e do percurso que tive no futebol, que não considero ter sido nada de especial, ajudar os mais jovens e pretendo mentalizá-los que é possível eles chegarem lá acima. Claro que não chega só o valor, mas se nós não pusermos em prática as qualidades que temos, também ninguém vai pegar em nós só porque sim e pôr-nos lá em cima. E claro, não é por ter 36 anos que não quero jogar. Claro que quero. Quero jogar sempre, também fui para lá para isso e vou estar insatisfeito sempre que não jogar. Contudo, ficar insatisfeito por não jogar não significa que vou criar mau ambiente. Não. Quero é ajudar ao máximo dentro do que eu puder.

CR: Que principal diferença vê no Distrital em relação aos patamares por onde passou?
JP: Acima de tudo, a mentalidade. Claro que a qualidade é outra, isso não tem comparação, mas o que faz a diferença nestes campeonatos é a mentalidade dos jogadores. Se nós fazemos um grande jogo em termos de entrega e compromisso, no jogo seguinte isso já de nada adianta. Já passou. Temos que fazer muito mais do que no jogo anterior. É preciso ter sempre os mesmos níveis de entrega e compromisso. Temos um treinador e uma equipa técnica com muita qualidade, com mentalidade de querer sempre mais, são muito profissionais dentro do amadorismo e é isso que eles tentam, e eu tento também, transmitir para a equipa. O clube eu já conhecia, já tinha sido adjunto lá há três ou quatro anos e agora fui encontrar uma realidade completamente diferente. Naquele tempo, não era um clube muito organizado, e hoje é, também porque o Rui conseguiu mudar mentalidades. Em termos estruturais também evoluiu bem, conseguiram trocar o sintético este ano e isso é uma mais valia porque o antigo estava muito desgastado e era até propício a lesões graves.

CR: Houve algo que lhe tenha custado mais neste regresso aos relvados?
JP: Deixar a minha filha. Não estava à espera disto e tenho coisas bem mais importantes para cuidar, neste caso, ela, e dar-lhe o acompanhamento que precisa. Não há dinheiro que pague isso e o tempo depois não volta, por isso, não quero um dia mais tarde pensar que naquela altura fiz isto mesmo sendo bom noutros campos… Não há outro campo. O mais importante, para mim, é o bem estar emocional dela. É o estar comigo e eu com ela pelo apoio que ela precisa para ter um crescimento normal e gradual.

CR: Para já, a temporada está suspensa pelos motivos que todos conhecemos. Como vê toda esta situação? Acredita que haverão condições para finalizar a época?
JP: É assim, eu não tenho opinião formada neste momento porque já tive várias e o contexto é muito complicado e novo para todos nós. Na fase inicial da pandemia, até cheguei a pesquisar situações antigas do género e a forma como terminaram. Acaba por ser complicado porque estamos sempre ali na insegurança se estamos infetados ou não, se podemos ir para o treino… Não sabemos como estamos e os outros não sabem como estão. O clube coloca álcool gel à entrada do estádio, toda a gente entra sempre de máscara, o nosso plantel fica dividido por quatro balneários… Ou seja, há cuidados. Eu entendo que suspender acaba por ser uma boa solução porque não há o controle que se faz noutros patamares e, mesmo assim, vemos os casos que existem nesses campeonatos e são testados regularmente. Claro que é sempre chato para nós, que queremos treinar e jogar, e temos de andar a correr na rua ou a saltar em casa, e lógico que não é a mesma coisa. Todos sentimos falta da bola, do convívio, mas é complicado e percebo perfeitamente porque em primeiro lugar está a nossa saúde, o nosso bem estar e o de todas as pessoas à nossa volta e não só.

LourosaGondomarJP(João Pedro, à direita, em ação durante o Lourosa – Gondomar da II Divisão em 09/10.)

CR: Olhando para aquilo que foi o início da sua carreira, o João faz toda a formação no Boavista, onde entra muito jovem. Como é que tudo aconteceu?
JP: Como acontece em grande parte das histórias, a escola para muitos acaba por ser um “hobby”, e os meus recreios eram prolongados (risos). Os constantes prolongamentos que eu fazia levaram a minha professora primária a falar com os meus pais para eu ir jogar para um clube. Como viviamos em Vizela na altura, o meu Pai queria meter-me no Vitória SC, mas como as nossas raízes são do Porto e o meu Avô Materno chegou a ter ligações ao Boavista, a minha mãe disse que se era para entrar no futebol, ia para o Boavista e assim foi. Um dia eu e o meu irmão fomos treinar ao Bessa e quiseram logo ficar connosoco.

CR: Durante esse trajeto nas camadas jovens, cruzou-se com dezenas de jogadores e muitos treinadores, além, claro, das muitas vivências e aprendizagens que teve. O que fica de todo esse processo formativo?
JP: Foi uma escola de vida. Aprendi coisas que nunca esquecerei. O saber estar, saber estar à mesa, os pequenos detalhes de, por exemplo, em torneios deitar cedo e ter de cumprir horários… Lembro-me que com o “Mestre” Jaime Garcia, ao sábado tinhamos de saber as medidas do campo de futebol todas: fosse a altura da barra, distância de um poste ao outro, da linha da pequena área à linha de golo, o diâmetro do meio-campo, enfim, essas pequenas coisas traziam-nos um bocadinho de responsabilidade porque obrigava-nos a estudar isso e sentiamos ali um pouco de responsabilidade e exigência. E depois tive “sorte” porque apanhei vários treinadores que tinham a mística do clube e aprendi sempre coisas diferentes com todos eles. Modéstia à parte, sempre me senti acarinhado por todos e rapidamente encarnei a mística do clube. Passaram por aquele clube um sem número de jogadores no meu tempo que podiam ter dado jogadores, mas alguns pelo contexto familiar, outros pelo contexto social e muitos outros pelo percurso normal do futebol, acabaram por não fazer grandes carreiras e foi pena. Aquela zona de Francos e Ramalde dava muito jogador ao Boavista e o chamado “jogador de bairro” tinha muita qualidade. Recordo-me que quando comecei tinhamos um “núcleo duro” muito engraçado, e embora fôssemos crianças já haviam os “pesos pesados”. Aliás, o primeiro torneio a que vou pelo Boavista, a Cannes, em França, é com eles: Daniel, Mauro, que era o nosso “menino de ouro”, André Marqueiro, Joel Plácido, filho do Jorge Plácido que agora é cantor, entre outros.

CR: No seu último ano de júnior, sagra-se Campeão Nacional, naquele que é, de resto, o último título que o Boavista conquistou nas camadas jovens a nível nacional até hoje. Como é que descreve essa conquista?
JP: Desde logo, com muita nostalgia porque ninguém acreditava em nós, ninguém mesmo, mas tinhamos um grupo que vinha de há já muitos anos, com jogadores há muitos anos no clube, como eu, Steven, Igor Rocha, Calvino, Vítor Borges, Carlos Sousa, Nélson Santos, Isidro, Carlos Pinto, Hugo Ferreira, Hugo Monteiro, Bruninho, e criámos um grupo muito unido, dinâmico, com um espírito de entre ajuda terrível. Éramos uma família com a mística do clube. E até te dou este exemplo: nós “fervíamos” se empatássemos ou se jogássemos mal. No campeonato, passar a primeira fase era uma obrigação, a segunda acabava por ser uma obrigação também, e na terceira havia quem acreditasse, mas, quem acreditava, deixou de acreditar quando perdemos 1-0 na 1ª Jornada com o Benfica. Havia ainda o FC Porto e o Vitória FC, que tinha eliminado o Sporting na fase anterior, e os grandes candidatos eram os “grandes”, com os internacionais todos, mas fomos fazendo o nosso caminho e conseguimos “dar uma chapada de luva branca” a toda a gente. Até acontece uma coisa curiosa na penúltima jornada: fomos ao Olival e podíamos ser Campeões nesse jogo e o mister Queiró, na palestra, transmite-nos uma mentalidade ganhadora, mas ao mesmo tempo diz que vai ser um jogo complicado, como todos em casa do FC Porto, e o árbitro, se não estou em erro, era o Martins dos Santos. Até começámos bem, fizemos o 1-0 de forma limpa mas o golo é anulado e o Porto acabou por ganhar. Mas no final do jogo ou no primeiro treino da semana, não sei precisar, o Queiró diz-nos: “Não conseguimos neste jogo mas vamos conseguir no próximo com toda a certeza!”. Ele sabia e nós sabíamos da qualidade que tinhamos. A direção do Boavista até nos sugeriu que jogássemos a fase final no Bessa, mas nós quisemos continuar na Pasteleira, onde jogávamos habitualmente e onde só perdemos pontos com a Académica, se não me engano, na primeira fase. A Pasteleira era o nosso “ninho”, não passava lá ninguém. Transmitíamos e punhamos em prática a mística do clube e isso levou-nos a atingir o título e fez com que muitos desses jogadores assinassem contrato profissional e jogassem pelo Boavista na I Liga.

JoaoPedro(A foto de João Pedro na FPF: o médio representou Portugal no Euro de Sub-19 em 2003.)

CR: Nessa mesma época, 02/03, é suplente não utilizado em três jogos da equipa principal do Boavista, então orientada por Jaime Pacheco, no campeonato. O que recorda desses momentos?
JP: Olha, para já, valorizava. Coisa que hoje em dia e de há muito tempo para cá não dão valor. Não têm sequer noção do respeito enorme que havia para com os mais velhos. Esperava que eles entrassem no autocarro e só me sentava depois de estar toda a gente sentada, a tomar banho esperava de igual forma, no balneário ficava no meu canto e não falava para ninguém… Isto parece ditadura, mas não é. São estas pequenas coisas que recordo e que me fizeram crescer. Nunca fui de me sentir pressionado, sempre lidei bem com pressão tivesse uma ou cinquenta pessoas a ver o jogo, porque como eu digo, pressão é agora nos hospitais e existe para aquelas pessoas que passam fome ou querem alimentar os filhos e não têm como. Eu ia para estágio com eles extremamente contente, muito sereno, tranquilo, e preparado para jogar caso o mister entendesse. E depois tive a sorte de todos eles me terem recebido muito bem. Eu era um miúdo educado, respeitador, sabia estar, e todas essas aprendizagens fizeram parte do meu percurso na formação do Boavista. Talvez por isso, por me conhecerem, é que a oportunidade também surgiu nesse ano e mais tarde fui integrado no plantel principal. Nunca fui pessoa de me gabar das coisas que conseguia ou das que poderiam acontecer, sempre fui muito “terra a terra” e o maior exemplo é de quando estive nos seniores do Boavista: ganhava bem, muitos compravam carros e até casas, mas eu pensava sempre: “Hoje estou aqui, mas amanhã posso estar num patamar diferente porque isto não depende só de mim”. E acabou por acontecer essa queda abrupta em termos desportivos, mas sempre estive bem porque os meus Pais transmitiram-me educação e valores, juntando àqueles que o clube me deu, que me ajudaram a manter uma “linha de orientação” e nunca me desviei dela independentemente das adversidades que surgiram, e acabaram por ser algumas.

CR: É precisamente depois de ser Campeão de Juniores, em 2003, que chega à Seleção e logo convocado para o Europeu de Sub-19. O que sentiu quando soube da convocatória?
JP: Foi o Daniel que me ligou a dizer que tinhamos sido convocados e eu pensei que era gozo, nem liguei nada àquilo (risos). Até ia fazer alguma coisa, já nem sei o quê, e fui fazer o que tinha a fazer (risos). Só acreditei quando o Sr. Manuel Barbosa, que era diretor, me ligou a dizer que estava convocado. Mas fiquei da mesma forma como quando fui chamado para ir aos seniores. Com os “pés assentes na terra”. Mas claro, foi um prazer enorme e valorizei o momento, mas sempre com o pensamento de que não era por ir à Seleção e ao Euro que a minha carreira ia ganhar logo outra dimensão. Aliás, tanto assim é que passei do Campeonato da Europa para o Ermesinde que estava na II Divisão B. E nunca na vida pensei que não ia para melhor ou coisa parecida. Só foi um “choque” por causa das condições que o clube tinha, era um clube modesto de II B, e eu não tinha conhecimento nem estava habituado, claro, mas a minha humildade foi sempre a mesma.

CR: Nesse Euro, Portugal até “sofre” para passar da fase de grupos mas acaba por perder na final diante da Itália de Chiellini, Aquilani ou Pazzini. O que falhou nesse jogo e o que recorda da vossa participação?
JP: Até estivemos quase para voltar a Portugal cedo, mas acabámos por dar a volta e conseguimos empatar com a Noruega na última jornada da fase de grupos, sendo que esse resultado dava a passagem à meia-final. Depois jogámos com a Áustria na meia-final e notou-se que era uma equipa mais madura e fisicamente muito mais forte do que nós, mas a nossa qualidade técnica resolveu o jogo no prolongamento (6-3). Na final, com a Itália, perdemos justamente (0-2) porque eles eram muito mais fortes do que nós em vários aspetos. Estavam uns passos à nossa frente, eram muito mais maduros, pareciam profissionais há muitos anos, e depois, claro, tinham muita qualidade, desde Chiellini, que era extremo, Della Rocca, Padoin, Potenza, Pazzini, Aquilani… O guarda-redes parecia que já jogava na Serie A há anos, só pela presença na baliza e pela experiência que já mostrava ter. Mas tinhamos um grupo muito forte, coeso, equilibrado, e com muita qualidade – João Pereira, Hugo Almeida, Paulo Sérgio, Amoreirinha, Paulo Ribeiro, entre outros.

CR: Na temporada 03/04 sobe a sénior e é emprestado pelo Boavista ao Ermesinde, que disputava a II Divisão B. Foi uma transição fácil?
JP: Não senti muito porque era um campeonato competitivo, ideal para eu jogar e crescer como realmente cresci. Foi muitíssimo bom e outra coisa positiva foi ter jogado contra jogadores que não conhecia e que jogavam muito. Se calhar, aquele campeonato estava ao nível da II Liga de agora. Nesse ano subiu o Gondomar, que tinha uma grande equipa, e ainda havia os Dragões Sandinenses, que tinham Riça, Bruno Tiago, Major, Chico Silva, Pedro Valente que é irmão do Nuno Valente… Tinham uma equipa brutal também e acabei por fazer o golo da minha vida contra eles em Sandim (risos). Apesar de, como disse, as condições do clube não serem as que eu estava habituado e do Ermesinde passar um período muito complicado a nível financeiro, foi uma época muito boa para mim. Passei por adversidades, lidei com condições diferentes, e joguei praticamente sempre que era o mais importante. E em Dezembro ou Janeiro até renovei com o Boavista e no final da época fui convocado para a digressão aos Estados Unidos e ao Canadá.

148073907_348286436215983_5109923062616991125_n(Um Boavista com muitas caras conhecidas na digressão aos Estados Unidos. João Pedro é o primeiro à esquerda na fila de baixo.)

CR: Apesar dessa descida, o João acaba por integrar o plantel do Boavista em 04/05, orientado por Jaime Pacheco, alguém que já o conhecia certamente muito bem tendo em conta o seu passado no clube. Foi um sonho tornado realidade para si, imagino.
JP: Sim, natural. A partir do momento em que chegas nem com 6 anos ao clube e passados tantos anos chegas a um balneário que tem jogadores ilustres, alguns tinham sido Campeões Nacionais pelo Boavista e tinham jogado na Liga dos Campeões, obviamente, só pode ser um motivo de orgulho porque fizeste as coisas bem feitas. Claro que foi um objetivo atingido chegar à equipa principal do Boavista e ao patamar mais alto do futebol português, depois de ter assinado contrato profissional ainda com idade de júnior. Tive o prazer de ser companheiro do João Pinto, que eu já tinha conhecido pessoalmente em miúdo porque o meu Pai foi funcionário do Benfica no Norte e levava-me muitas vezes aos hotéis para conhecer os jogadores, e ele ajudou-me muito, deu-me vários conselhos, especialmente na fase em que treinava fora da minha posição. Fazia-me uma confusão enorme treinar a central, não era falta de humildade, era irreverência, e ele aconselhava-me sempre. Lembro-me que até cheguei a dividir o quarto com ele num estágio: o falecido Vítor Nóvoa é que nos dizia os quartos, foram saíndo dois a dois e eu a pensar: “Queres ver que ainda vou ficar com o João?”. E ficámos mesmo. Tremia por todo o lado (risos). Entrámos no elevador, eu sempre caladinho, ele abriu a porta do quarto, eu deixei-o entrar e escolher a cama, claro, e o comando da televisão até estava na minha cama e, quando ele foi à casa de banho, eu atirei o comando para a cama dele (risos). São coisas que levo para a vida. Nem dois dias foram, mas ele deu-me muitos conselhos e sempre com uma humildade tremenda. Aliás, ele nunca nos transmitiu falta de humildade por ter a carreira que tinha. Nada, zero. Grande profissional e uma excelente pessoa.

CR: Entre Campeonato e Taça faz 11 jogos, 7 deles a titular. Esperava mais?
JP: Claro que esperava mais. Atenção, isto não é falta de humildade da minha parte. Eu respeitava fosse quem fosse, mas queria era jogar, e claro que contava jogar mais. Mas se não joguei, se calhar, não merecia e poderia não ser o momento certo. Vejo o Pacheco como um treinador que me ajudou muito e apostou em mim. Não foi mais ninguém, foi ele. E se ele achou que não eram jogos adequados para mim, eu aceito isso de bom grado. Até tenho uma história com ele nesse sentido.

CR: Conte.
JP: Há um jogo em Leiria para o qual não fui convocado e fiquei numa azia tremenda. Havia no dia seguinte ao jogo treino para os não convocados, em que fazíamos um aquecimento normal e tinhamos uma pelada que durava muito tempo. Treinei normal, mas sempre com o rosto fechado. Estás ali na azia com 20 anos? Era o que faltava. Mas não era por mal, era a minha irreverência… Acabou o treino, alongámos e íamos para o banho, só que ele chamou toda a gente e disse-me à frente do grupo: “Menino, vou-te dizer uma coisa: época passada estavas no Ermesinde e nem bolas tinhas para treinar. Hoje estás aqui no Boavista e na I Liga. Pensa bem nisso”. Foi um “aviso”. Claro que aquilo me “entrou”. Precisava daquilo porque, inconscientemente, podemos estar a fazer coisas que achamos que não têm mal e têm. E depois ainda disse que ia pensar se me dava o prémio de jogo porque todos tinhamos percentagem em caso de vitória. No final da semana fui lá bater à porta do balneário, veio o Prof. Natal à porta e eu disse que queria falar com o mister para saber se recebia o prémio. Ele dá um suspiro e diz: “Vai lá receber que mereces. E olha uma coisa, ainda vais ser titular desta equipa e, a seguir ao Petit, vais ser o gajo que mais dinheiro vai dar ao clube”. Mas eu não fiquei “em bicos de pés” com aquilo. Passadas umas semanas comecei a jogar, estreei-me na I Liga com o Nacional, a central, porque estavam castigados o Cadú e o Éder e o Jorge já tinha saído, então fiz dupla com o Hélder Rosário e até foi o meu melhor jogo. Tive a melhor nota da equipa nos jornais pela estreia que fiz. Passado alguns dias voltámos a jogar com o Nacional, agora para a Taça, e voltei a ser titular: ele diz os centrais e eu fiquei tranquilo, mas depois diz o meu nome para jogar no meio-campo e fiquei surpreendido porque não estava mesmo à espera.

CR: Era um Boavista forte com João Pinto, Tiago, Toñito, Nélson, Hugo Almeida, entre outros, e a verdade é que quase até ao fim do campeonato estiveram sempre perto do 1º lugar. Falava-se no balneário da possibilidade do clube voltar a ser Campeão?
JP: Sim. Lembro-me perfeitamente do mister nos dizer a certa altura que aquilo que passava lá para fora, para a imprensa, não era aquilo que ele realmente pensava e queria, que ambicionava ser Campeão novamente. Foi um campeonato muito atípico e podia ter caído para nós com um bocadinho de sorte. O Porto perdeu muitos pontos em casa, nós fomos lá ganhar, o Benfica foi Campeão e não tinha uma grande equipa, e o Sporting jogava um futebol brutal, era o melhor dos três. Nós tinhamos uma mescla de jogadores bons com outros que eram muito melhores do que medianos e podíamos ter feito uma “gracinha”. Recordo-me de se ter falado no título durante algum tempo, mas depois já numa fase final acabámos por ter jogos que não nos correram tão bem e, a partir de certa altura, começámos a focar-nos na Taça, passámos duas eliminatórias complicadas, com Nacional e Marítimo, e perdemos em Setúbal na meia-final. Fizemos um percurso muito bom. A seguir a isso, queríamos a qualificação para a Europa, porque era muito importante em termos financeiros para o clube ir à Europa, mas acabou por ir o Vitória SC. Foi uma época em que podíamos ter conseguido mais, sem dúvida.

sacchettijp(João Pedro ao lado de Esteban Sachetti, argentino com quem jogou no Doxa de Chipre.)

CR: Na temporada seguinte, já com Carlos Brito a treinador, o João acaba por ser cedido ao Beira-Mar, que tinha acabado de descer à II Liga. A que se deveu este empréstimo?
JP: Não tenho mesmo a certeza. Ou melhor, tenho, mas não quero dizer que tenho. Se fosse o mister Jaime, eu tenho a certeza absoluta que não saía. Nunca senti muita empatia com o diretor desportivo. Haviam brincadeiras, o menino isto o menino aquilo, mas eu não era menino dele coisa nenhuma porque sentia que ele não gostava de mim, nunca senti muita empatia, ao contrário do que acontecia com o Paulo Gonçalves, que era o único com quem eu sentia empatia e era prestável comigo, preocupava-se. Digamos que foi uma dispensa administrativa, que eu aceitei, sem problema, não fiquei melindrado por causa disso. Até me recordo que quando sou chamado à SAD para uma conversa, estava com um amigo meu em casa e disse-lhe que me tinham ligado para ir à SAD e certamente era para ser emprestado. Ele disse que eu era maluco, que se mandava da varanda se isso acontecesse, e eu disse-lhe que podia ir indo porque era isso que ia acontecer… E estava certo. A conversa foi que o Carlos Brito não contava comigo e tal, e eu sim senhor, pouco falei. Até que depois surgiu o Beira-Mar através do Rui Neno. Há um dia em que vou visitar o Sandro, que é um colega da formação que teve um acidente grave, e encontro lá o Bosingwa, com quem me dava muito bem desde as camadas jovens, ele perguntou pela minha situação, eu expliquei e ele disse que depois falava comigo. O Rui Neno era empresário dele, penso que do Inácio também, e uma coisa levou a outra e surgiu assim a hipótese do Beira-Mar. Aliás, até fui ganhar mais dinheiro para o Beira-Mar, mas isso não era coisa a que eu olhasse muito, sinceramente.

CR: Mas em Aveiro, acaba por ter pouca utilização dentro de um plantel fortíssimo que venceu a II Liga com Augusto Inácio a treinador. O que aconteceu?
JP: As coisas começaram muito bem, estava super motivado. Falei com o Jorge Silva sobre o clube, a cidade, etc., e as informações que ele me passou foram as melhores. Tinhamos excelentes condições de trabalho, de I Liga mesmo, a cidade era fantástica, salários em dia, as pessoas do clube impecáveis… Estava tudo dentro do normal. Tinhamos uma equipa muito forte para a II Liga, e a minha concorrência era grande porque tinhamos um meio-campo de I Liga, com Luís Vouzela, Torrão, Rui Lima e Zé Roberto, e ainda chegaram Diakité e Labarthe, duas apostas pessoais do mister. Penso que chego lá dois ou três dias depois da pré-época ter começado, mas faço uma pré-época normal, e percebi rapidamente que o mister dava muita importância à receção e ao passe e ao jogar simples e eu fazia “o meu”, como se diz, jogava bem, de forma simples, era inteligente na ocupação dos espaços, e as coisas correram bem. Entretanto, o campeonato começa e sou titular na 1ª Jornada no Santa Clara, em que até sofro um penalti que o Labarthe falhou. Nesse jogo, o Torrão ficou de fora por lesão e na semana do segundo jogo volta a treinar, até que na palestra antes do jogo com o Feirense o mister diz: “A equipa é a mesma da semana passada, só há uma troca e é por questões táticas: entra o Torrão e sai o João Pedro”. Não foi questão tática nenhuma, foi uma simples troca de jogador. E eu reagi mal. Não de palavras, claro, mas “amuei” no treino, ainda fui convocado algumas vezes e fiz alguns jogos até que comecei a ser “castigado” e vou jogar para o Avanca, que era o clube satélite e estava na III Divisão.

CR: Augusto Inácio nunca lhe deu uma explicação?
JP: Não, nada. Durante esse período que fui jogando pelo Avanca, fui sempre profissional ao máximo e as pessoas do clube diziam-me que não percebiam o que estava ali a fazer, que tinha qualidade para jogar no Beira-Mar. Possivelmente isso começou a chegar aos ouvidos do Inácio, que, um dia, me chama no Estádio de Aveiro e diz que as pessoas do Avanca não estavam contentes comigo, que eu não estava a ser profissional… Eu achei muito estranho e pensei logo que ou em Avanca me estavam a “dar a banha da cobra” ou era uma mentira da parte dele. Então, falei com o mister do Avanca, Nazih Andem, contei-lhe a situação e ele disse logo que isso não era verdade, que ninguém estava insatisfeito com o meu comportamento lá. Nesse mesmo dia, salvo erro, falei com o Inácio e disse-lhe que aquilo que ele andava a dizer era mentira e ele defendeu-se dizendo que só disse o que ouviu. Provavelmente não estava à espera que eu me fosse inteirar da situação.

CR: Gostou dessa experiência de jogar pelo Avanca?
JP: Sinceramente, ao início foi um choque. Pensava mesmo: “Então agora vou jogar para a III Divisão?”. Não conhecia as pessoas do Avanca, não sabia sequer ao que ia… Custou-me ir. Até me recordo que no primeiro fim-de-semana que sou convocado para ir jogar pelo Avanca fiquei tão desanimado que havia um jogo “grande” em Portugal e eu nem jantei nem quis ver de tão triste que estava. Depois comecei a ir com frequência e ganhei o gosto: não me habituei àquilo, porque logicamente queria era jogar pelo Beira-Mar, mas, no fundo, estava ali “emprestado” e com o objetivo de jogar e ter minutos. As condições em Avanca eram muito boas, o campo era muito bom, as pessoas eram fantásticas, não deixavam que nada nos faltasse e tiveram sempre palavras elogiosas para comigo. Só tenho a dizer bem.

148969645_139671064665165_6036620933074735139_n(Uma notícia do jornal “OJOGO” com João Pedro em destaque.)

CR: Não ponderou sair?
JP: Ponderei, claro. Em Dezembro digo que me quero ir embora porque precisava de jogar, e há ali um período entre Dezembro e Janeiro que volto a jogar e a titular. Pensei que as coisas iam continuar dessa forma, mas no início da segunda volta, já perto do fecho das inscrições, volto a sair da equipa antes do jogo com o Feirense, agora em Santa Maria da Feira, e na semana seguinte vou ao banco com o Maia. O mercado fechou passados uns dias e depois só voltei a integrar a ficha de jogo e a jogar com o Varzim, já muito perto do final do campeonato. Deu-me um “rebuçado” quando eu quis sair, pôs-me a jogar, para depois me fazer passar uma autêntica “travessia no deserto”. Reagi muito bem ao facto de ter saído da equipa dessa segunda vez e deixei de ser convocado sem razões. Até fiquei mesmo surpreendido por ser convocado para esse jogo na Póvoa, não estava mesmo à espera sequer de ser suplente tendo em conta o histórico, mas acabei por entrar e entrei bem. Lembro-me de chorar no balneário e de alguns colegas meus me darem os parabéns porque sabiam o que tinha passado e a forma como as coisas se desenrolaram. Mas gostei muito de viver em Aveiro e de jogar no Beira-Mar. Posso mesmo dizer que não notei diferença nenhuma porque parecia que estava na I Liga.

CR: Segue-se nova cedência em 06/07, desta feita ao União de Lamas da II Divisão B, um clube com que o Boavista tinha boas relações, mas que também passava por maus momentos financeiramente e acaba por descer de divisão. Foi, ainda assim, uma boa experiência?
JP: Sempre tirei coisas boas para o meu crescimento em todos os clubes onde passei e no Lamas isso também aconteceu. Apanhei um clube semelhante ao Ermesinde na condição financeira, mas com outras condições. Um clube com muito potencial mas ao mesmo tempo que estava, de certa forma, abandonado, com balneários normais e com um estádio bom, apesar de muitas vezes, quando chovia, termos de treinar no pelado para “poupar” o relvado. Foi um clube onde pude voltar a jogar com regularidade e onde cresci apesar de termos descido porque a situação do clube não era lá muito boa como já disse, haviam alguns problemas a nível diretivo também, e a equipa não era muito forte para o campeonato em questão.

CR: Acaba por ficar na história do Pedro Martins, dado que o agora treinador do Olympiacos se estreou como treinador precisamente no Lamas nessa época, e o João fez parte do primeiro 11 da carreira dele.
JP: Olha, não sabia (risos). Ter-me cruzado com o Pedro Martins foi das melhores coisas que me aconteceram em Lamas. Um treinador muito nosso amigo e que me dizia muitas vezes que via em mim potencial para estar noutros patamares e que não devia estar ali. Dizia até que me achava com condições para ser um grande “box to box” porque era rápido e forte fisicamente apesar de ter só 1,77 de altura. Eu dividia as bolas com os “artistas” e eles caiam tipo pinheiros naquela altura (risos). Era muito forte nesse aspeto e ele transmitia-me essa ideia. Recordo até uma história em que tinhamos salários em atraso e não ganhávamos, e o treino, um dia, foi no balneário com ele a falar individualmente de cada jogador. E quando chegou à minha beira, como sabia que eu era benfiquista, disse que um dia se fosse para o Benfica que me levava (risos). Ele tentou ao máximo não deixar cair aquilo, foi fantástico nesse aspeto, mas chegou a uma altura em que ele próprio não aguentou mais e acabou por ir embora. Tem aquele semblante carregado, faz parecer que é uma pessoa triste, mas não é, é uma pessoa fantástica, com um bom coração, e com quem, infelizmente, perdi o contacto. Foi dos treinadores mais importantes que tive na minha carreira.

CR: No Verão de 2007 termina a sua ligação com o Boavista.
JP: Sim, já levava 12 meses de salários em atraso, não seguidos mas no total, e entendi que o meu ciclo ali tinha terminado, provavelmente voltaria a ser emprestado até final do contrato, e decidi rescindir por justa causa com mais alguns colegas e fomos para o Sindicato à procura de uma solução e de outro rumo. Claro que me custou muito acabar com uma ligação que já durava desde os meus 6 anos. Dou-te este exemplo: quando estava na equipa principal, em 04/05, era o jogador com mais anos de casa, nem o Jorge Silva tinha mais do que eu. Mas o clube estava a começar a ficar descaracterizado e isso também me fez rescindir.

bfcjun(O plantel que fez do Boavista Campeão Nacional de Juniores em 2003. João Pedro é o primeiro no lado direito da fila de baixo.)

CR: E seguiu-se o Chipre. Foi a melhor opção?
JP: Foi. Tive algumas possibilidades de ir para a II Divisão B, mas não queria e o tempo foi passando até que em Novembro fui à Roménia treinar à experiência ao Universitatea Cluj por intermédio do Sérgio Leite. As coisas correram bem nos primeiros dias, tanto que até vim a Portugal buscar mais algumas coisas minhas e só me faltava fazer exame médico aos olhos, salvo erro. Quando voltei, fizemos um treino contra uma equipa da II Liga, mas não me correu muito bem porque estava parado há algum tempo e não tinha piton de alumínio, escorreguei muitas vezes. Depois fui fazer o tal exame que faltava, esperei pelo resultado e o médico disse que por ele tinha o aval e o clube agora ia decidir se ficava ou não. E eu fiquei a pensar naquilo. Entretanto, ligou-me o emprésario romeno que estava a fazer a ligação com o Sérgio e disse para ir ao hotel falar com ele. Eu fui lá e ele disse que no exame tinha acusado muita graduação e que isso podia interferir com a luz do jogo. Eu fiquei um bocado parvo, percebi logo o que estava a acontecer, mas também já não estava com muita vontade de lá ficar por tudo o que me fui apercebendo, a parte financeira era a única coisa que valia a pena e, claro, não queria deixar mal o Sérgio. Liguei ao Sérgio, disse que queria ir embora, e quando cheguei a Portugal, ele ligou-me a perguntar se queria ir novamente à experiência, mas desta vez ao Chipre. Eu disse que sim e quando lá cheguei encontrei uma realidade completamente diferente de Cluj, que era uma cidade escura e suja, e no Chipre apanhei logo um tempo bom e via palmeiras, etc., foi logo um impacto muito positivo. Estive três semanas à experiência e acabei por assinar.

CR: Passou duas épocas no Chipre, sempre na II Liga, ao serviço de ASIL e Digenis. Como correram essas temporadas?
JP: Nessa primeira época, no ASIL, joguei com dos portugueses, o Vítor Rodrigues, que eu conhecia da formação do FC Porto, e o Rui Varão, e fui para o mesmo hotel onde eles estavam, então isso ajudou muito. O treinador gostou do que viu naquelas três semanas, quis ficar comigo e eu aceitei. Era um clube simpático, modesto, sem grandes pressões, que estava a tentar subir mas estava sempre tudo bem. Aliás, quase sempre (risos). Houve uma situação em que perdemos com o último e tiraram-nos logo 25% do ordenado sem nos dizerem nada porque estava estipulado no regulamento (risos). Mas pagaram sempre certinho, arranjaram-nos casa e fizemos uma temporada normal, um campeonato tranquilo. Depois surgiu a hipótese do Digenis, um projeto para subir, sediado na capital, Nicósia, e onde tinhamos umas condições fantásticas: treinávamos no centro de treinos do Doxa, onde treinam até várias equipas, porque aquilo tem muitos relvados e jogávamos no Makario, que é o estádio onde jogam, por exemplo, o Doxa e o Olympiacos de Nicósia. Tinha um bom salário, apesar de que atrasavam alguns meses, mas o que ganhava dava para gerir bem, cheguei a estar três ou quatro meses sem receber e nunca passei dificuldades porque sempre pensei que o mais importante é o dia de amanhã e fui fazendo o meu “pé de meia”, estava salvaguardado para se acontecesse algum infortúnio. Lutámos para subir até ao fim mas não conseguimos. Lembro-me de uma situação que é, no mínimo, duvidosa (risos). Comigo estava o Bruno Baltazar, que já foi treinador do Olhanense, do Estoril e do APOEL, nós jogávamos praticamente sempre e há um jogo importante, contra o Olympiacos, em que estámos em estágio e o diretor vem ao nosso quarto perguntar se estávamos preparados para jogar, nós dizemos que sim, claro, e ele diz que não sabia se íamos jogar (risos). Nós ficámos a olhar um para o outro. Fomos para o banco, estivemos a perder 0-2, entretanto mandou-nos aquecer, meteu o Bruno, central, posteriormente entrei eu, fizemos o 1-2 e eu já “fervia” por todos os lados (risos). Só me lembro do treinador dizer: “Calma, calma”. E nós a perder (risos).

CR: O seu regresso a Portugal dá-se “pela mão” do Gondomar, em 2009, onde joga duas épocas na II Divisão. Como surgiu esta possibilidade?
JP: Surgiu novamente através do Sérgio Leite. Foram dois anos em que tentámos subir e nunca conseguimos. Na primeira época tivemos uma fase menos boa: jogávamos bem, mas perdemos muitos pontos e cedo ficamos longe também porque o Moreirense fez um grande campeonato e o 1º lugar ficou praticamente “entregue” a muito tempo do fim. Na época seguinte, o mister Fanã sai logo no início para o Kuwait e vem o Vítor Paneira, que eu já conhecia das tais idas aos hotéis quando o meu pai era funcionário do Benfica. Ele não me conhecia mas tem uma abordagem engraçada comigo logo no primeiro dia, porque tinha ido ver o jogo para a Taça no fim-de-semana anterior e eu fui titular. Então quando me vem cumprimentar diz: “Tu jogas muito!”. O mister conhece bem o meu Pai mas só ficou a saber quem eu era ao fim de uns meses, quando vamos a um jogo para a Taça à Póvoa e o meu Pai vai ver o jogo e ao fim está a falar com ele e ele pergunta-lhe o que estava ali a fazer. O meu Pai diz que tem o filho a jogar no Gondomar, ele pergunta quem é, e nisto eu apareço e o Paneira diz: “Porque é que nunca me disseste que o teu Pai é o Armindo?”. E eu respondo: “Mas eu tinha que dizer isso porquê?” (risos). Andámos praticamente sempre na luta mas acabámos por perder a pouca esperança que tinhamos num jogo precisamente no Bessa que é quando deixo de ser convocado a alguns jogos do fim, porque chutei um balde no fim do jogo e quase acertou no adjunto. Mas fiz aquilo sem propósito nenhum, fiquei possuído por ser suplente, ainda por cima contra o Boavista no Bessa. Acabei por entrar quando estávamos com menos um e depois no fim aconteceu isso e o mister ficou a olhar para mim. Ainda me convocou no último jogo e acabei por não jogar. Mas depois ficou tudo bem entre nós e hoje em dia temos uma relação normal, até costumámos falar.

jplamas(João Pedro alinhou no União de Lamas em 06/07, onde foi treinado por Pedro Martins.)

CR: E em 11/12 volta a Chipre para jogar no Doxa, igualmente da II Divisão. Porquê?
JP: Desde logo porque já conhecia o País e o convite era para um clube que tinha um projeto de subida e que, normalmente, tinha muitos portugueses, como aconteceu naquela época. Metade eu sabia quem eram, claro que não ia só por serem portugueses, mas do que conhecia deles, sabia que podíamos atingir o objetivo, que era, declaradamente, a subida. E não só subimos como conseguimos ser Campeões. Lógico que monetariamente também compensava, ia ser Pai passados três meses e o que ia receber também pesou na decisão. Mais uma vez atrasou alguns meses, mas, como disse, o que eu ia ganhando conseguia gerir muito bem e nunca tive problemas.

CR: Como já falámos, voltou esta época a jogar. Tem perspetivas de jogar por muito mais tempo?
JP: Isto que vou dizer pode parecer uma contradição mas não é: eu penso no dia a dia mas também gosto de pensar um bocadinho mais à frente. Poderei estar a jogar daqui a um ano, mas não estou a ver isso a acontecer, sinceramente. A minha filha é a minha prioridade e no próximo ano letivo irá para o 5º Ano, que é uma mudança radical, num contexto totalmente diferente do que ela está habituada, e eu quero estar presente nessa mudança, quero acompanhá-la ao máximo para a ajudar. Apesar de ter namorada, neste momento ainda não vivemos juntos, mas é um dos passos que queremos dar, e, lá está, quero estar presente mesmo quando dermos esse passo. A minha continuidade como jogador vai depender muito disto. Mas primeiro, há que pensar neste ano, e se dá para ajudar os meus colegas e o clube, jogo a jogo, para no final vermos como estámos e se conseguimos atingir os objetivos a que nos propusemos.

CR: Disse há pouco que já foi treinador adjunto. Vê-se como treinador no futuro?
JP: Sinceramente, e já pensava isto naquele tempo e continuo a pensar neste momento, não me vejo como treinador (risos). Gosto de ajudar, gosto, por exemplo, de corrgir certos aspetos aos jogadores que jogam ali no meio, essas coisas gosto. Agora, planear e dar treinos, para já, não me vejo porque acho até mais cansativo e ocupa muito mais tempo do que jogar.

CR: Que história pode partilhar?
JP: Recordo-me de uma entre o Guga e o Jaime Pacheco. O mister participava sempre nos treinos quando era posse de bola ou joguinhos com balizas pequenas ou balizas grandes, e treinava sem caneleiras, óbvio (risos). Ele ficava sempre num quadrado grande na linha lateral e o Guga era uma pessoa muito bem disposta, criava bom ambiente independentemente de ser titular ou não jogar. Há um treino que estávamos a fazer 5×5, o mister nessas alturas normalmente fazia de joker, e num lance dividido o Guga deu-lhe um carrinho ou uma “voadora”, já não sei precisar, e o Pacheco ficou a olhar para ele (risos). No fim, estávamos a alongar e o mister fala: “Há aqui gajos que nos treinos são leões e nos jogos são gatinhos” (risos). O Guga, que sabia perfeitamente que era para ele, responde tranquilo: “Há-de me dizer qual foi o jogo…”. E o Pacheco diz: “Se tivesse que te pôr a jogar estava bem f*****!” (risos).

jpfigura(João Pedro foi destacado pelo jornal “OJOGO” aquando da sua estreia a titular no Boavista.)

De Primeira

CR: Qual o melhor momento da sua carreira até agora?
JP: Ter entrado para o Boavista FC e depois ter-me estreado pela equipa principal.

CR: Qual o adversário mais difícil que já defrontou?
JP: Cadinha.

CR: Qual o melhor jogador com quem jogou?
JP: João Pinto.

CR: Que treinador mais o marcou até hoje?
JP: Vou citar três, todos no Boavista: Jaime Garcia, José Amarante e Jaime Pacheco.

CR: Em que médio defensivo atual se revê?
JP: Ljubomir Fejsa.

Schuster: “Acho que tenho condições para chegar aos campeonatos profissionais”

Schuster(Schuster representa o Gondomar desde 2016/2017.)

A época 2019/2020 ficará para sempre marcada na carreira de Schuster, avançado do Gondomar, que por uma conjugação de fatores, não conseguiu jogar de forma oficial nesta temporada que foi forçosamente interrompida.
Depois de se lesionar com gravidade na pré-época – rotura de ligamentos num tornozelo -, Schuster estava já preparado para regressar aos relvados no passado mês de Março, contudo, o surgimento do Covid-19, “trocou as voltas” ao atleta gondomarense.
Em entrevista ao nosso blog, o avançado ressalva que as lesões fazem parte do futebol e os jogadores devem estar preparados para tal, salientando ainda que a situação atual nos ultrapassa a todos e que, por isso, está já focado em voltar aos relvados em perfeitas condições na próxima temporada:
“Senti uma desilusão enorme na pré-época, porque uma pessoa prepara-se durante as férias de Verão para poder jogar e dar o seu melhor contributo à equipa e depois não consegue devido a uma lesão grave. Mas, infelizmente, isso faz parte do futebol. Temos que estar preparados psicologicamente para isso, se não, nem podíamos ser jogadores. Agora, com esta situação do Covid-19, tive outra desilusão, claro. Agora que estava pronto a jogar e depois de tanto tempo sem o poder fazer, com o ‘bichinho’ de querer entrar e ajudar sempre presente… Enfim, aconteceu isto, mas é o que é e é algo que nos ultrapassa a todos. Será por motivos de força maior que não vou poder jogar oficialmente esta época, mas certamente que no próximo ano as coisas vão correr melhor e aí já vou poder jogar da maneira que quero e que gosto”, afirmou.
Na semana passada, a FPF anunciou a decisão de acabar oficialmente com a temporada do Campeonato de Portugal sem que houvessem descidas, situação que até “salva” o Gondomar, que era a primeira das cinco equipas colocadas na zona de despromoção da Série B ao fim de vinte e cinco jornadas.
Na opinião de Schuster, só quando esta situação estivesse devidamente ultrapassada é que se deveria pensar em retomar ou não os campeonatos, sendo que esta decisão da FPF agrada a uns e desagrada a outros como seria expectável:
“Sinceramente, estou um bocado dividido neste assunto, pela situação em que estamos, que não está nada fácil. Acabar agora é bom para alguns e mau para outros, isso é evidente, mas acho que só mesmo quando isto passasse totalmente, é que se podia e devia pensar em retomar o que quer que fosse. Para já, penso que não devemos correr riscos, até porque o futebol é um desporto que leva muita gente aos recintos desportivos, vão haver sempre multidões a comparecer aos jogos e isso são situações que não se podem evitar”, disse o avançado que nos revelou um pouco daquilo que tem sido a sua quarentena, onde tem concentrado esforços para manter a forma física:
“Não tem sido uma quarentena muito produtiva, digamos assim. Mas arranjo sempre um tempo para treinar e manter a forma física, o que não tem sido fácil, por ter estado tanto tempo parado. À semelhança dos outros clubes, seguimos todos o plano que nos foi dado pela equipa técnica e fomos mantendo o contacto entre todos”, contou.
Sete vitórias, seis empates e doze derrotas em vinte e cinco partidas “deram” vinte e sete pontos ao Gondomar, que apesar de ocupar um lugar incómodo à data da suspensão do campeonato, até já tinha conseguido “bater o pé” ao líder Arouca (1-0).
Schuster afirma que estava a ser uma época complicada para a turma da “capital do ouro”, que sofreu muitas mudanças em relação a 2018/2019 e foi ainda “castigada” pelo aparecimento de lesões em vários jogadores com preponderância na equipa:
“Creio que foi uma época complicada para nós. Foi uma época de mudanças, como todos sabem, e acho que foi uma época um bocado injusta para connosco no aspeto das lesões: eu lesionei-me com gravidade na pré-época, tivemos a lesão do Fabinho ali a meio da temporada que nos prejudicou e antes outros jogadores sofreram lesões ao longo da primeira volta, como o Tiago Gomes e o Digas. Enfim, houve muitos fatores que nos prejudicaram, mas, como já disse antes, são coisas que fazem parte do futebol e nós tinhamos que estar preparados para lidar com isso. Mas acredito que íamos melhorar nesta fase final do campeonato e terminar num lugar tranquilo”, analisou.
Formado maioritariamente no FC Porto, por quem se sagrou Campeão Nacional de Iniciados, Schuster estava já a cumprir a quarta temporada consecutiva ao serviço do Gondomar, clube onde chegou proveniente do Neves, em 2016/2017.
O jogador, que pode alinhar como ponta de lança ou como extremo, faz um balanço positivo da sua carreira até ao momento, assegurando que vai continuar a trabalhar para chegar a outros patamares:
“Faço um balanço positivo da minha carreira. Tem sido um percurso de muita aprendizagem, como é óbvio, e com algumas conquistas, tanto na formação como a nível sénior. Penso que tenho feito uma carreira bastante boa, com algumas complicações, mas as coisas são como são e não se pode fazer nada quanto a isso. Resta-me apenas continuar a trabalhar e lutar para atingir um patamar melhor e fazer um percurso mais a meu gosto”, frisou Schuster, que na hora de olhar aos momentos mais marcantes do seu trajeto, destacou, pela positiva, os títulos que conquistou e o momento em que se tornou internacional por Portugal:
“Momentos positivos, destaco a conquista do Campeonato Nacional Sub-15 pelo FC Porto, em 2010/2011; a subida da Divisão de Honra para a Divisão de Elite, em 2017/2018, pelo Gondomar B; e as quatro internacionalizações que tenho por Portugal. Quem joga futebol sonha jogar pela Seleção e representar o seu País e eu não sou diferente. Senti um orgulho enorme por ser chamado e nunca mais me esqueço que a minha primeira convocatória, nos Sub-15, foi para defrontar a Alemanha. Representar Portugal é, sem dúvida, um sentimento de orgulho e deixa-me arrepiado só de pensar nisso. Pelo lado negativo, refiro as lesões que tenho sofrido. Tenho tido algum azar até: nos Sub-17, na fase final de 2012/2013, sofri um pneumotórax, que é um problema pulmonar, e não pude jogar as duas jornadas que faltavam no apuramento de Campeão; e agora, mais recentemente, além desta lesão grave no tornozelo, tenho tido lesões que têm atrapalhado o meu percurso. Infelizmente também já desci de divisão, pelo Neves, em 2015/2016, em que tinhamos quase uma ‘missão impossível’ no Campeonato de Portugal, fizemos resultados que surpreenderam tudo e todos, mas depois não foi possível conseguirmos a manutenção até derivado a fatores extra-futebol que nos prejudicaram em momentos cruciais”, enumerou.
Nove épocas no FC Porto marcam, inevitavelmente, a carreira de Schuster,  que depois de fazer quase trinta golos no segundo ano de Juvenil, deixou os “Dragões” e o País por motivos familiares, mas, pouco tempo depois, regressou a Portugal e teve dois anos de Júnior “atribulados”, dado que representou quatro clubes diferentes.
O atleta, que fez parte de uma geração portista da qual constavam nomes como Andorinha, Verdasca, Rui Moreira, Sérgio Ribeiro ou Luís Mata, não esquece todos os momentos que viveu nos azuis e brancos e mostra-se orgulhoso por ter representado o clube durante tantos anos:
“Saí do FC Porto no final da época 2012/2013 porque ia viver com os meus pais para a Bélgica, que foi para onde o meu Pai conseguiu arranjar trabalho e íamos mudar-nos para lá. Joguei nove épocas no FC Porto, dos sete aos dezassete anos e guardo muitos momentos e memórias que não se apagam: desde os jogadores que ‘passaram por mim’ e com quem partilhei o balneário e o campo; torneios a que fomos e que ganhámos; todas as outras pessoas que conheci, fossem treinadores, diretores ou funcionários do clube; e os títulos que conquistámos, claro que são momentos que ficarão comigo para sempre. Sem dúvida que ter usado aquela camisola desde pequenino quase até à idade adulta é gratificante e é um orgulho enorme para mim”, recordou Schuster, que nos confidenciou os motivos que o fizeram vestir quatro camisolas diferentes nos dois últimos anos de formação:
“Entretanto, chegando à Bélgica, tive outra crise pulmonar e fiquei internado um mês e meio no hospital, depois de ter sido operado ao pulmão esquerdo. Acabei por voltar a Portugal e fui para o Leixões, onde dei início a um conjunto de más decisões que me trouxeram alguma instabilidade nos dois anos de Júnior. No Leixões comecei a jogar na equipa B, que estava no Distrital da AF Porto e fiz um jogo no Campeonato Nacional, pela equipa principal, contra o Vizela. Depois surgiu-me uma oportunidade de ir treinar ao Sporting, eu fui, e claro que isso não ficou bem aos olhos do Leixões, sendo que acabei depois por sair para o Boavista e acabei lá a época. Na época seguinte mudei-me para o Gil Vicente, mas comecei lesionado, porque tinha partido o quinto metatarso no Verão. Quando a época arrancou, comecei de fora claro, mas ganhei o meu espaço, fui jogando, fui entrando, mas não estava a ter o tempo de jogo pretendido, e isso aliado a algumas desavenças com o treinador, fizeram com que decidisse sair porque precisava de jogar, de marcar e, principalmente, de sentir confiança. Fui para o Varzim, para tentar ajudar o clube a manter-se na I Divisão de Juniores, o que infelizmente não conseguimos, mas deu para voltar a ser feliz a jogar futebol”, confessou.
Relativamente ao seu futuro, Schuster mostra-se ambicioso e acredita que tem condições para chegar aos campeonatos profissionais, assumindo que, no estrangeiro, gostava de experimentar o futebol inglês ou o futebol alemão:
“Espero ainda poder chegar à II Liga e à I Liga. Acho que tenho condições para isso, portanto, é continuar a trabalhar, pois acredito que se não tiver mais lesões como as que tive ultimamente, posso perfeitamente atingir esse nível. Em termos internacionais, sem dúvida que gostava muito de jogar na Premier League ou na Bundesliga, pois a Alemanha é um País que sempre me cativou, e claro, também gostava de disputar a Champions League”, revelou Tiago Garcia, vulgo Schuster, que não terminou a nossa conversa sem revelar a origem da sua alcunha:
“Cheguei ao FC Porto com sete anos e o Mister Álvaro Silva, um ‘clássico’ da formação do FC Porto, perguntou-me se sabia quem era o Schuster. Eu respondi que não e então ele disse: “vai pesquisar e vais ver que és muito parecido” (risos). Na altura, como era loiro e usava o cabelo grande, ele batizou-me como Schuster e ficou até hoje. Aliás, toda a gente me trata por Schuster, até na família às vezes acontece, portanto, já é um nome quase meu também (risos)”, concluiu.
Schuster, de 23 anos, começou a jogar futebol nas Escolinhas do FC Porto, clube que representou durante nove temporadas até aos Juvenis, seguindo-se, posteriormente, nos Juniores, as passagens por Leixões, Boavista, Gil Vicente e Varzim. Como sénior, já esteve ao serviço de Varzim B, Neves, Gondomar B e Gondomar. Internacional por Portugal, somou quatro internacionalizações nos Sub-15.

Zé Pedro: “O grupo queria e merecia mais”

Zé Pedro(Zé Pedro fez trinta e três jogos e seis golos entre CNS e Taça de Portugal.)

O Gondomar ficou perto de chegar ao Play-Off do Campeonato de Portugal, terminando a Série B na terceira posição, depois de ter sido líder durante grande parte da competição.
A formação da “capital do ouro” claudicou nas últimas seis jornadas, em que só venceu metade dos jogos e viu Lourosa e Espinho “fugirem” na frente da classificação.
Zé Pedro, central dos gondomarenses, falou com o blog sobre a temporada da sua equipa, começando por efetuar o balanço de 2018/2019:
“O balanço da época acaba por ser positivo, apesar do sentimento de amargura que ficou no final por não termos conseguido chegar ao Play-Off. O facto de termos estado nos dois primeiros lugares durante a maior parte do campeonato, é algo que nos deixa orgulhosos do nosso trabalho, mas, apesar do objetivo principal ter sido alcançado, o grupo queria mais e merecia mais”, considerou.
Com sete vitórias nas primeiras oito jornadas, o Gondomar só perdeu pela primeira vez no campeonato ao décimo segundo jogo, e foi líder isolado durante vinte e seis jornadas consecutivas – da 3ª à 28ª.
Apesar da boa performance ao longo da temporada, a equipa amarela e azul acabou, como já foi dito, no terceiro lugar, com 64 pontos, resultado de dezoito triunfos, dez empates e seis empates em trinta e quatro jogos, marcando cinquenta golos e sofrendo vinte e dois.
Na opinião de Zé Pedro, o Gondomar não pode “apontar o dedo” a ninguém por não chegar à fase decisiva do CNS, porque todos trabalharam para alcançar esse objetivo:
“(O que falhou para não chegarem ao Play-Off?) Acho que não devemos entrar por aí. O que falhou foi um conjunto de situações, que não nos permitiram chegar ao Play-Off. Não sinto que devemos ‘apontar o dedo’ a ninguém dentro da estrutura e do grupo de trabalho, porque sinto que todos os envolvidos fizeram o melhor em prol do clube. Claro que falhámos, todos, em alguns jogos que devíamos ter feito melhor, e isso fez com que deixássemos escapar esta oportunidade de ir mais além na competição”, afirmou.
Olhando para aquilo que foi o percurso da formação gondomarense na Série B do CNS, pode-se dizer que o Lourosa foi o seu maior “carrasco”: os lusitanitas venceram os dois jogos, o primeiro deles na 12ª Jornada, provocando a primeira derrota do Gondomar; e, no segundo, na 29ª Jornada, ao vencerem no Estádio de São Miguel, destronaram a equipa da casa da liderança.
Passando para segundo, o Gondomar consentiu um empate no terreno do União da Madeira logo na 30ª Jornada, venceu as duas partidas seguintes, e, em nova deslocação à “Pérola do Atlântico”, perdeu com o Marítimo B, caindo para terceiro a uma jornada do final.
Zé Pedro sublinha que, naturalmente, foi frustrante para a equipa não chegar ao Play-Off, mas, uma vez mais, o central voltou a realçar que não se deve culpar ninguém nem arranjar desculpas que justifiquem o terceiro lugar da sua equipa:
“Como é óbvio, foi frustrante para todos o que aconteceu, porque queríamos muito alcançar o Play-Off. Sentimos todos que merecíamos mais, o grupo, o clube merecia mais, e, na verdade, sentimos, por vezes, alguma injustiça, porque parecia que não nos queriam deixar seguir o nosso caminho. Mas volto a frisar, que não vou estar a ‘apontar o dedo’ a nada, nem ninguém, nem a arranjar desculpas com nada. Neste momento é passado, e todos devemos tirar ilações e prosseguir o nosso caminho”, salientou.
Campeonato à parte, na Taça de Portugal, o Gondomar ultrapassou o Leça na primeira eliminatória (2-0), e foi derrotado na ronda seguinte, pelo Cova da Piedade, da II Liga, que teve de “suar” para levar de vencida os gondomarenses – 1-2.
Relativamente aos momentos da época, Zé Pedro destaca e ‘divide’ a época da sua equipa em duas partes distintas:
“Penso que temos de dividir a nossa época em duas fases distintas: a primeira volta e a segunda volta. Na primeira volta, fomos fortíssimos. O arranque de campeonato, foi, sem dúvida, o melhor momento como equipa para nós, mas, depois, na segunda volta, penso que não conseguimos manter o ritmo em termos de resultados, e esse foi o momento menos positivo da época. São situações normais no futebol, em que todas as equipas têm fases boas e fases menos boas, e penso que foi esse o nosso caso”,  destacou.
Depois de oito épocas consecutivas a jogar na Segunda Liga, Zé Pedro estreou-se esta temporada no Campeonato de Portugal, e fez cinco golos em trinta e um jogos na competição.
O central, que já foi anunciado como uma das renovações do Gondomar para a próxima época, sente-se grato ao clube por este o ter ajudado numa fase menos boa da sua carreira e promete uma equipa a querer ganhar todos os jogos em 2019/2020:
“O que me fez continuar no Gondomar, foi o facto de querer ser grato pelo o que o clube me deu numa fase menos boa da minha carreira. Acredito no projeto e sinto-me valorizado aqui. Os objetivos do clube passam por fazer o melhor a cada jogo, não vamos estar com discursos desmedidos de dizer que queremos subir de divisão, porque todos os clubes que competem neste campeonato, querem subir, querem ganhar todos os jogos e nós vamos entrar em todos os jogos para ganhar. Esse é o grande objetivo, fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para ganhar. A nível pessoal, vou continuar a trabalhar e fazer sempre o meu melhor. Acredito que as coisas acabam por acontecer. Nesta fase da minha carreira, não faço planos a longo prazo, penso no momento, em fazer o melhor a cada dia, e isso só poderá trazer coisas boas no futuro”, finalizou.
Zé Pedro, de 28 anos, começou a jogar precisamente nas Escolinhas do Gondomar, de onde se mudou para o FC Porto, tendo estado ao serviço dos ‘dragões’ durante oito épocas, entre Escolinhas e Juniores, no qual se inclui um empréstimo ao Padroense, nos Juvenis. No último ano de júnior tornou-se jogador do Leixões, por quem subiu a sénior, e jogou, durante cinco temporadas, na Segunda Liga. Depois, passou por Sp. Covilhã e Famalicão, antes de chegar ao Gondomar na presente época.

Sp. Espinho 0-0 Gondomar

Espinho0-0Gondomar

Sp. Espinho e Gondomar empataram esta tarde, sem golos, em jogo da quarta jornada da Série B do Campeonato de Portugal.
Forçados a jogarem em “casa emprestada” esta temporada, os espinhenses continuam, mesmo assim, a contar com uma forte falange de apoio dos seus fiéis adeptos.
A jogar, para todos os efeitos, “em casa”, o Espinho fez o que lhe competia, assumiu o jogo e procurou jogar futebol perante um Gondomar, líder do campeonato com nove pontos em nove possíveis, mais retraído no terreno e a procurar jogar em profundidade. Ambas as equipas estiveram desinspiradas, quiçá por causa do calor que se fez sentir, com uma primeira parte muito “amarrada” e com um segundo tempo ligeiramente mais “aberto”.
Não foi, por isso, de estranhar, que a primeira situação de golo só tenha acontecido aos 17′ minutos, para o Espinho, quando após cruzamento na esquerda, Carlitos serviu Gustavo à boca da baliza, mas este foi desarmado ‘in extremis’ por um defensor forasteiro.
O Gondomar, fruto da estratégia que assumiu neste encontro, só conseguiu chegar com algum perigo à baliza contrária através da marcação de um livre, que Huguinho até atirou contra a barreira.
No segundo tempo, o Espinho começou a criar perigo logo aos 52′ minutos, quando na sequência de um livre, se gerou alguma confusão na área gondomarense, contudo, sem que a bola tenha tomado a direção da baliza.
Os espinhenses voltaram a ameaçar aos 73′ minutos, quando Carlitos falhou por pouco a emenda após remate de Paulinho.
O Gondomar respondeu na marcação de um livre, por intermédio de Chico Sousa, aos 78′ minutos, que obrigou Vítor Braga a uma defesa apertada.
Pouco depois, aos 82′, Abdoulaye Daffe, o melhor marcador dos gondomarenses com quatro golos em quatro jogos, teve um bom lance individual, mas atirou por cima.
Já em período de compensação, o Espinho teve a última oportunidade de golo por intermédio de Van Zeller, que na cobrança de um livre, obrigou Yerjeti a desviar a bola para canto.
O empate é justo, num jogo em que o Espinho teve mais iniciativa e procurou em certos momentos, jogar de pé para pé, mas esbarrou na estratégia defensiva do Gondomar, que por sua vez, tentou, sem sucesso, tirar partido do contra-ataque e de bolas em profundidade.
Na próxima semana, o Campeonato de Portugal tem a sua primeira paragem, dando lugar à primeira eliminatória da Taça de Portugal. 

📝 Ficha de jogo:

🏟️ Estádio: do Bolhão, em Fiães

Árbitro: Renato Gonçalves (Portugal)

 Sp. Espinho: Vítor Braga; João Ricardo, Gil Dias, Zé Santos e Gonçalo (Van Zeller 68′); Luka Oliveira, Zé Nando (Henrique 72′), Leo e Carlitos; Paulinho (Wilson 81′) e Gustavo.

Treinador: Rui Quinta. Não utilizados: Rui Nibra, João Pinto, Edgar Abreu e André.

🔵💛 Gondomar: Yerjeti; Mica, Rui Filipe, Meneses e Huguinho; Andrés, Fabinho e Miccoli (Diogo Silva 45′); Yao (Chico Sousa 62′), Abdoulaye e Vieirinha (Xoura 90+2′).

Treinador: José Alberto. Não utilizados: Tavares, Relvas, Hélder e Cai.

 Disciplina:

Amarelos: Miccoli 23′; Gil Dias 33′; Meneses 51′; Vieirinha 87′; Wilson 90+1′; João Ricardo 90+3′.

Marcador: nada a assinalar.