Tiago Gonçalves: o furacão canhoto que está a varrer a Sicília

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Tiago Gonçalves, lateral/ala esquerdo que representa o Messina, é o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

Há exactamente dez dias, o ACR Messina, uma versão original do emblema que passou duas épocas na Serie A italiana na década de 2000, era penúltimo no seu agrupamento na Serie C, o terceiro escalão do futebol transalpino, com 18 pontos em 20 jornadas. De repente, tudo mudou – e o responsável, obviamente, tem sangue lusitano: no derby siciliano em casa do histórico Palermo, foi de cabeça que Tiago Gonçalves iniciou a recuperação da sua equipa (perdia 2-0 ao intervalo e acabou por conseguir chegar ao 2-2 final); já na visita ao reduto do líder, o também histórico Bari, foi com o seu amado pé esquerdo que selou, já muito perto do apito final, a tão saborosa quanto surpreendente vitória (1-2, também com direito a reviravolta), concluindo com sucesso um contra-ataque carregado de veneno.

Dois golos em jogos consecutivos que tornaram Tiago Gonçalves no novo menino-bonito dos adeptos. O jovem (21 anos) natural de Cascais, refira-se, voltara à titularidade precisamente na partida em Palermo, depois de alguns meses sem conseguir esse estatuto – que tinha ostentado apenas em três ocasiões até então, entre Outubro e Novembro (curiosamente, na primeira vez em que jogou de início… fez uma assistência); agora é já impensável efectuar um desenho táctico do Messina sem contar com o atleta luso, tal como aconteceu novamente já este sábado no empate caseiro diante do Foggia (1-1).

Com formação dividida entre União de Tires e Belenenses (foi ao serviço dos Azuis do Restelo, de resto, que foi chamado aos trabalhos das selecções jovens), Tiago Gonçalves arriscou partir à aventura para fora do país logo no primeiro ano de sénior, integrando a equipa de sub-20 do Génova. Ali somou 20 jogos (e 3 assistências), numa temporada encurtada devido ao surgimento da pandemia do coronavírus, e a meio de 2020/21 aceitou ser cedido ao Valladolid com o intuito de fortalecer a equipa secundária do emblema presidido por Ronaldo Fenómeno; o facto de a equipa se encontrar então em plena luta pela subida à II Liga espanhola, porém, acabou por não lhe permitir sequer conseguir a estreia oficial (suplente não utilizado em apenas quatro ocasiões).

Finda a pouco profícua passagem por terras espanholas, terminou também a sua ligação contratual ao Génova. Foi assim que surgiu a hipótese Messina, clube recém-promovido ao terceiro escalão do futebol italiano; Tiago Gonçalves resolveu aceitar o desafio e manter-se em Itália, e por agora pode dizer-se que pelo menos em termos individuais a aposta está a resultar: soma já 3 golos e uma assistência em 14 jogos disputados e começa a dar nas vistas de emblemas com outras aspirações. A nível colectivo, é verdade que a equipa ainda está longe dos melhores cenários – continua na zona de despromoção (17º num campeonato com 20 equipas), com 23 pontos em 25 jogos e a 4 da zona segura; ainda assim, é bastante claro que se encontra numa fase ascendente em termos exibicionais e acima de tudo anímicos, pelo que não surpreenderá ninguém que no final da temporada se venha a festejar a permanência no seio do emblema siciliano. E, está claro, com um bom português lá pelo meio.

Jota: a pérola encarnada que recuperou o brilho na Escócia… e de verde

Celtic FC v Ross County FC - Cinch Scottish Premiership

Jota, extremo que representa o Celtic por empréstimo do Benfica, é o jogador em destaque esta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

Uma das maiores promessas do futebol português na última década parece estar finalmente a conseguir encontrar o seu espaço na realidade do futebol sénior. Esta descrição acaba até por ser genérica, tal é a quantidade de talento surgida nos escalões de formação do nosso futebol nos últimos anos, mas neste caso específico falamos de um dos atletas com melhor palmarés de sempre nas camadas jovens, membro de uma geração mais que dourada tanto em termos de selecção como do clube onde fez toda a formação – neste caso, o Benfica: o atleta em questão é João Pedro Neves Filipe, Jota nas lides futebolísticas.

Sem espaço nos planos de Jorge Jesus, o jovem nascido em Lisboa a 30 de Março de 1999 aceitou ser cedido ao Celtic e no histórico emblema escocês tem vindo finalmente a mostrar todos os atributos que lhe eram reconhecidos desde tenra idade, somando 3 golos e 4 assistências nos 9 jogos realizados na Escócia (todos como titular) entre Campeonato, Taça da Liga e Liga Europa. No último fim-de-semana, por exemplo, abriu o marcador e fez também a assistência para o 2-0 final ante o Motherwell, tendo entretanto voltado a assistir no triunfo (curiosamente por 2-0) sobre o Ferencváros, o primeiro do Celtic nesta edição da Liga Europa – neste caso com um passe de ruptura absolutamente sublime.

Desde muito cedo que Jota é apontado como a próxima grande estrela a sair dos escalões de formação do Benfica, onde chegou aos 7 anos. Ali fez todo o percurso formativo, assinando o primeiro contrato profissional ainda como juvenil, em 2015, e com apenas 16 anos já via o seu nome associado ao interesse de alguns dos maiores clubes europeus, nomeadamente depois da conquista do Campeonato da Europa de sub-17. Por essa altura já tinha sido também campeão nacional em iniciados e juvenis e viria a sê-lo também em juniores, sagrando-se ainda vice-campeão da UEFA Youth League em 2016/17 (numa altura em que já representava a equipa B na II Liga) depois de ter bisado na estrondosa vitória por 4-2 sobre o Real Madrid nas meias-finais – um tal de João Félix fez os outros dois golos encarnados…

No início de 2017/18 renovou com o Benfica até 2022 (com cláusula de rescisão no valor de 30 milhões de euros) e no verão seguinte juntou mais uma medalha de campeão europeu à sua colecção, sendo mesmo o melhor marcador (cinco golos em cinco jogos) do Europeu de sub-19 no qual Portugal se sagrou vencedor na Finlândia, batendo a Itália numa final electrizante: 4-3 após prolongamento com mais um bis de Jota. Nomeado para a votação do Golden Boy pelo prestigiado jornal italiano Tuttosport, dividiu-se durante 2018/19 pelas equipas de juniores e B das Águias e na fase final da temporada foi mesmo aposta de Bruno Lage em 6 jogos da formação principal, para onde foi definitivamente promovido no verão de 2019, já depois de ter sido apontado a mais uma dúzia de tubarões, entre os quais o Real Madrid, o Barcelona e o Bayern de Munique.

Na equipa principal, porém, nunca conseguiu demonstrar o brilhantismo que transbordava nos escalões de formação. Ao todo fez 28 jogos (apenas 6 como titular), 2 golos e outras tantas assistências (tendo a meio da época renovado por mais 2 anos, com a cláusula de rescisão a subir para os 88 milhões de euros), mas o rendimento não convenceu os responsáveis encarnados nem tão pouco Jorge Jesus, que decidiu prescindir dos seus serviços no início de 2020/21. O jovem lisboeta seguiu então por empréstimo para a Liga espanhola, pela porta do Valladolid, mas também ali não deslumbrou, apesar de alguns lampejos de classe – marcou na estreia, por exemplo: apenas 18 jogos, só 8 como opção inicial, e 2 golos numa equipa que terminou o campeonato no 19º e penúltimo lugar da tabela, sendo por isso despromovida.

Nova época, mesmo cenário: Jota ainda integrou os trabalhos do Benfica no início da actual temporada mas rapidamente se percebeu que continuava fora dos planos da equipa técnica. A solução encontrada foi o Celtic, num empréstimo com opção de compra – não divulgada pelos clubes – efectivado em cima do fecho do mercado. Curiosamente, o jovem atacante até tinha uma relação afectiva com o histórico emblema de Glasgow “desde os 11 anos”, motivado por uma troca de cachecóis com um adepto dos Católicos aquando de uma partida entre Benfica e Celtic no Estádio da Luz, e a mesma vai agora ganhando novos capítulos a cada partida disputada.

Aos 22 anos, Jota começa assim a afirmar-se como “adulto”, precisamente no momento em que viu fechadas de vez as portas das selecções jovens – a última aparição nos sub-21 coincidiu com a final do Europeu da categoria na qual Portugal foi derrotado pela Alemanha no último verão, competição onde fez 1 golo em 3 das 18 internacionalizações que somou na categoria desde 2018. “Acho que cada um tem o seu caminho e cada um tem de estar preparado, o meu tempo não é o tempo de outro. Há uns que fazem uma carreira a pique, sempre a subir, outros que andam irregulares, outros que chegam e vão-se abaixo. Eu estou em paz com isso, porque se ainda não chegou o meu momento, é porque não tinha de chegar. Tenho de me manter tranquilo, dar o litro para aprender todos os dias e reinventar-me constantemente. Sei onde quero estar, sei onde não quero estar, o que também é importantíssimo, mas tudo será fruto do que eu fizer”, dizia em entrevista ao ZeroZero em dezembro último; ao que tudo indica, neste momento poderemos já estar finalmente a viver no tempo de Jota.