Rafael Leão: o rei dos goleadores portugueses pela Europa em 2022/23


(Rafael Leão, Fábio Silva, Josué, Rafael Lopes e Miguel Cardoso foram alguns dos portugueses que mais faturaram nos Campeonatos Europeus em 22/23.)

Em virtude do encerramento da maioria dos campeonatos europeus, o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo é dedicado aos portugueses mais goleadores em 22/23:

Na última paragem dos campeonatos para os compromissos de selecções, em Março, aproveitámos para fazer o balanço da temporada até esse momento em termos de golos apontados por atletas portugueses nas ligas europeias (escalões principais apenas e sem contar com o campeonato português). Pois bem: finalizada a época, decidimos fazer então a análise final aos números registados pelos goleadores nacionais e ver se algo mudou na tabela.

Feitas as contas, Rafael Leão foi o grande artilheiro português em 2022/23. O avançado do AC Milan marcou 15 golos na Serie A pelos Rossoneri, mais do que qualquer outro jogador luso em campeonatos nacionais europeus na temporada, juntando ainda a esta contabilização outro tento, apontado na Liga dos Campeões, para um total de 16 golos ao longo da época – ainda em Itália, realce para Beto, que apontou 10 golos só no campeonato pela Udinese, número igualado por Flávio Paixão ao serviço do Lechia Gdansk na Polónia.

Número semelhante ao de Fábio Silva, que liderava este registo no balanço efectuado em Março e que entretanto se deixou ultrapassar por Rafael Leão, apontando apenas um golo desde então – no mesmo período, o avançado Rossonero fez 7. Fábio Silva somou 11 tentos no Anderlecht (7 na Liga belga) e 5 no PSV Eindhoven (4 no campeonato dos Países Baixos), num total de 11 golos nos 2 campeonatos que experimentou na temporada agora finda.

O nome mais surpreendente do top-3 acaba por ser o de Josué, que aos 32 anos protagonizou porventura a melhor temporada da sua carreira: com a braçadeira de capitão do Legia, apontou 12 golos na Liga da Polónia e mais 3 na Taça, competição que conquistou após o triunfo sobre o campeão Raków no desempate por grandes penalidades, depois do 0-0 registado no tempo regulamentar. O internacional português, de resto, acabaria mesmo a ser nomeado para Melhor Médio do campeonato.

Outra época de sonho viveu Jota na Escócia: além dos 3 troféus conquistados, apontou ainda 11 golos no campeonato e 2 na Taça (um deles na vitória sobre o Inverness por 3-1 na final) e outros tantos na Liga dos Campeões, num total de 15 tentos – melhor marca da carreira enquanto sénior, superando os 13 da temporada de estreia no Celtic. Não houve mais nenhum português a atingir a marca dos 2 dígitos a nível de campeonato, mas Bruno Fernandes conseguiu-o no somatório de todas as competições: aos 8 tentos apontados na Premier League, juntou 3 na Taça, 2 na Taça da Liga (que conquistou) e 1 na Liga Europa, acabando a época com 14 golos marcados pelo Manchester United.

O valor maior a partir daqui foi alcançado por Hugo Firmino ao serviço do Ararat-Arménia (9 golos), com João Félix a somar 8 entre Atlético de Madrid e Chelsea (4 em cada), juntando mais 1 tento pelos Colchoneros na Copa do Rei. Também Nélson Oliveira e Rafael Lopes chegaram aos 9 tentos no total: o primeiro fez 7 na liga grega e dois na taça pelo PAOK; o segundo apontou 6 no campeonato do Chipre e 3 na liga Europa pelo AEK Larnaca.

Rony Lopes (Troyes – França) e Miguel Cardoso (Turquia), com 7, completam o top-10 dos goleadores portugueses nas ligas europeias em 2022/23 – sendo que o extremo do Kayserispor marcou mais 1 tento na Taça. Realce ainda para uma evidência: dos principais campeonatos do continente, só na Alemanha não houve um português a chegar sequer aos 5 tentos – André Silva e Raphael Guerreiro fizeram ambos 4 por Leipzig e Dortmund respetivamente, com o avançado a marcar mais 5 golos na época (2 na Taça e 3 na Liga dos Campeões) e o ala esquerdo mais 2 na Champions.

Rafael Lopes: em busca de engrandecer o palmarés

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Rafael Lopes, ponta de lança que representa os cipriotas do AEK Larnaca, é o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

É um dos portugueses que mais tem deixado marca no estrangeiro nas últimas épocas e aos poucos tem vindo a ganhar o seu espaço no AEK Larnaca, para onde se transferiu no último verão após três épocas na Polónia. Rafael Lopes soma 6 golos no conjunto cipriota, com o que apontou na pretérita jornada a ser garantidamente o mais bonito, num remate acrobático que abriu a vitória por 2-0 em casa do Paralimni na ronda 13 do campeonato.

Esta é já a quinta temporada do avançado natural de Gemeses, concelho de Esposende, a jogar longe de Portugal. Tudo começou em 2017/18, quando deixou o Chaves para rumar ao Omonia, um dos principais emblemas cipriotas. Marcou 7 golos em 27 jogos e regressou ao nosso país no fim da temporada para representar o Boavista, mas no verão de 2019 voltou a emigrar, desta feita para a Polónia, assinando por dois anos com o Cracóvia.

Ali seria imensamente feliz, apontando 13 golos (segunda melhor marca da carreira) e levantando a Taça como capitão após vitória por 3-2 sobre o Lechia Gdansk na final (curiosamente também capitaneado por um português, Flávio Paixão). A belíssima temporada acabaria por precipitar a mudança para o bem mais ambicioso Legia, o maior clube do país, sagrando-se desde logo campeão pela primeira vez na carreira (e única até ao momento), contabilizando 25 jogos, divididos de forma quase igual entre a titularidade e a condição de suplente utilizado, e 5 golos.

A segunda época já não seria tão positiva: o Legia terminou o campeonato num modesto décimo lugar, sendo que até meio da temporada andou abaixo da linha de água, chegando mesmo a registar-se episódios de violência dos adeptos para com os jogadores. Rafael Lopes até fez mais jogos (44) e mais golos (7) que no ano anterior, mas acabou por sair no fim da temporada e voltar ao Chipre, assinando por 2 anos com o AEK Larnaca, vice-campeão em 2021/22.

Ali, o ponta-de-lança luso tem vindo a impor-se aos poucos, sendo parte importante de um grupo que já fez História esta temporada. Apesar de não ter conseguido superar a segunda pré-eliminatória de acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões (caiu nos penáltis diante dos dinamarqueses do Midtjylland, que depois defrontariam o Benfica e agora irão enfrentar o Sporting na Liga Europa), o AEK Larnaca chegou à fase de grupos da Liga Europa após eliminar Partizan de Belgrado e Dnipro e terminou no terceiro posto num grupo com Fenerbahçe (de Jorge Jesus), Rennes e Dínamo de Kiev, garantindo assim presença nos 16-avos-de-final da Liga da Conferência, onde irá defrontar… novamente o Dnipro no próximo mês de Fevereiro.

No campeonato, o emblema de Larnaca subiu na última ronda ao segundo posto, em igualdade pontual com o até aqui líder Paphos, e agora a dois pontos do APOEL, que venceu no reduto deste último por 2-1 e assim ascendeu ao topo da tabela. Está também em competição na Taça, tendo encontro marcado com o também primodivisionário Nea Salamis para 11 de Janeiro. A concorrência para Rafael Lopes é feroz, desde logo pelas presenças do histórico Ivan Trickovski, internacional macedónio que cumpre a oitava temporada no clube, de Ádám Gyurcsó, internacional húngaro, e de Omri Altman, internacional por Israel que iniciou a última temporada no Arouca. Ainda assim, o avançado português tem conseguido intrometer-se na luta pela titularidade e registou mesmo no último mês a melhor sequência da temporada, com 4 jogos seguidos a começar de início – marcou no primeiro e no último.

Aos 31 anos, Rafael Lopes está na fase de maior maturidade de uma carreira iniciada no Esposende, o clube da sua terra, mas que começou realmente a decolar com a mudança para o Varzim, no segundo ano de juvenil. A primeira época de sénior foi belíssima, com 31 jogos (28 como titular) e 11 golos na II Liga e a convocatória para representar Portugal no Mundial de sub-20, tendo sido titular no primeiro jogo e suplente utilizado noutros três na caminhada lusa rumo à final com o Brasil (aí não saiu do banco).

Sem surpresa, foi contratado de imediato por um clube primodivisionário – no caso, o Vitória FC –, somando 29 aparições e 4 golos pelo emblema sadino em 2011/12. Mudar-se-ia para o Moreirense na temporada seguinte, mas a experiência em Moreira de Cónegos revelou-se penosa: Rafael Lopes foi titular apenas 4 vezes em toda a época (e nunca no campeonato), não marcou qualquer golo e o emblema minhoto acabaria por descer de divisão.

O avançado decidiu então dar um passo atrás e voltou à II Liga, agora pela porta do Penafiel. E ali voltaram também os golos: foram 15 em apenas meia época, que proporcionaram o regresso ao escalão principal logo em Janeiro via Académica. Em Coimbra não conseguiria marcar qualquer golo até ao fim da temporada (13 jogos), somando 10 nas duas épocas seguintes, e em 2016/17, após a queda dos Estudantes no segundo escalão, mudou-se para o recém-promovido Chaves.

Em Trás-os-Montes somaria 5 golos em 35 jogos, antes de viajar para o Chipre pela primeira vez. No regresso a Portugal faria 3 golos em 28 jogos pelo Boavista, encetando depois nova aventura que dura até hoje – primeiro na Polónia, agora novamente no Chipre. Internacional jovem apenas nos sub-20, na tal caminhada que culminou com o vice-campeonato mundial em 2011, Rafael Lopes acabou por não voltar à rota das selecções nacionais, traçando ainda assim um percurso sólido em Portugal e entretanto também em divisões principais de outros dois países europeus, onde construiu currículo, marcou golos e ganhou troféus; o objectivo passará agora por continuar a engrandecer o palmarés, de preferência já a começar na temporada actual.

Josué: de “bad boy” a abono de família de um gigante em agonia

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Josué, médio-ofensivo que representa os polacos do Legia de Varsóvia, é o destaque desta semana na rubrica/parceria entre a nossa página e a página À bola pelo Mundo:

Se há jogador que está a fazer jus à palavra “reforço” para o Legia de Varsóvia na temporada em curso, esse é Josué. Contratado no verão aos israelitas do Hapoel Beer Sheva, o criativo nascido há 31 anos em Ermesinde tem feito a diferença de forma superlativa essencialmente num dos capítulos onde sempre se destacou, as assistências: já são 12 esta temporada, a que se somam os dois golos apontados no último mês de Março, num registo assinalável para uma equipa que, inexplicavelmente, chegou a estar já… abaixo da linha de água há pouco mais de três meses.

Após ter protagonizado a melhor temporada da sua carreira (foram 13 golos e 6 assistências na segunda época em Israel), e no que é a fase de maior maturidade do seu percurso futebolístico, Josué aceitou o convite do crónico campeão polaco com a intenção de continuar a somar troféus ao seu currículo – e nomeadamente o de campeão nacional, algo que ainda nunca conseguiu alcançar. Os planos, porém, deram a ideia de sair furados logo desde muito cedo: além de ser afastado logo na terceira pré-eliminatória de acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões, diante do Dínamo de Zagreb (empatou 1-1 na Croácia e perdeu 1-0 em casa), o Legia começou o campeonato a somar resultados negativos uns atrás dos outros, chegando a viver um período com sete derrotas consecutivas!!!, algo impensável para um emblema campeão nacional por 15 ocasiões (sete das quais nos últimos dez anos).

Josué, porém, foi sempre demonstrando estar um patamar acima dos restantes colegas: mesmo nessa fase mais negra fez três assistências. O clique definitivo, porém, parece ter chegado com o novo ano e após a paragem de inverno da Liga polaca: nos sete jogos feitos pelo Legia em 2022, o médio atacante luso soma um golo e quatro assistências, contribuindo decisivamente para quatro das cinco vitórias registadas pela sua equipa neste período – e consequente subida na tabela: depois de à jornada 22 se encontrar num humilhante 16º lugar, o conjunto de Varsóvia está agora no 11º posto, cenário menos alarmante mas ainda assim muito decepcionante (são 21 os pontos de distância em relação ao líder Pogon). Nesta fase, falta ainda referi-lo, o Legia garantiu também o apuramento para as meias-finais da Taça, vencendo por 2-0 o Leczna com um golo e uma assistência… de Josué, pois claro.

Que Josué tem um talento imenso, isso nunca foi motivo de dúvidas ou questões. Durante muito tempo, porém, terá sido porventura a vertente psicológica a fazer estagnar ou atrasar o crescimento futebolístico de um jogador desde sempre tido como uma grande promessa… mas também como um verdadeiro “bad boy”, com dificuldades em cumprir regras e lidar com figuras de autoridade. Assim se explicam os sucessivos anos de empréstimo, em Portugal e no estrangeiro (Covilhã, Penafiel e VVV-Venlo), e a saída em definitivo para o Paços de Ferreira em 2011/12 de um jogador que se estreou na equipa principal do Porto aos 19 anos, numa partida da Taça da Liga ante o Vitória FC (2-1) sob o comando de Jesualdo Ferreira em 2008/09.

A belíssima segunda temporada na Capital do Móvel (a tal que acabou com o Paços em terceiro e a apurar-se para a pré-eliminatória da Liga dos Campeões) acabaria por proporcionar o regresso ao seu clube do coração, cumprindo um desejo expresso de Paulo Fonseca (e aproveitando o facto de o Porto ter mantido sempre 50 por cento do passe), e a temporada de 2013/14 foi mesmo a melhor da sua carreira até então, com 5 golos e 10 assistências em 35 jogos de dragão ao peito e a chegada à selecção nacional. Somou, de resto, quatro internacionalizações entre Outubro de 2013 e Março de 2014, tendo ficado “célebre” o gesto obsceno que dirigiu aos adeptos suecos aquando do hat-trick de Cristiano Ronaldo na segunda mão do play-off que ditou o apuramento de Portugal para o Mundial do Brasil.

A época positiva a nível individual, porém, contrastou com o desempenho abaixo do expectável em termos colectivos, que acabou por resultar na saída precoce de Paulo Fonseca do comando técnico dos dragões. Josué ainda foi sendo opção aqui e ali para Luís Castro, mas veio mesmo a fazer parte do lote de dispensáveis no fim da temporada, seguindo por empréstimo para o Bursaspor; após ano e meio na Turquia, relativamente bem sucedido (39 jogos e 9 golos em 2014/15, 17 partidas nos primeiros 6 meses de 2015/16), voltaria a Portugal pela mão do Braga… e novamente de Paulo Fonseca. E em boa hora – pelo menos para os bracarenses: ali totalizou 22 jogos e 5 golos, um dos quais na final da Taça de Portugal em que os Guerreiros do Minho venceram… o Porto (no desempate por grandes penalidades após o 2-2 registado no tempo regulamentar).

As excelentes prestações nessa segunda metade de temporada levá-lo-iam a ganhar nova vida no Porto… pelo menos em teoria: depois de ter sido anunciado oficialmente como integrante do plantel por nada mais nada menos que o próprio Pinto da Costa, Josué acabaria por ser cedido ao Galatasaray, envolvido no negócio que levou Alex Telles a fazer o caminho inverso. No gigante de Istambul faria 33 jogos e 4 golos, números que no entanto acabaram por não se revelar suficientes para o levar de volta ao Dragão ou rumar a um clube de nível pelo menos semelhante: no verão de 2017 seria oficializada a sua rescisão definitiva com os azuis-e-brancos e a assinatura por dois anos com o Osmanlispor, também da Turquia.

Os dois anos acabariam por se transformar apenas em seis meses: por motivos extra-futebol, Josué foi afastado da equipa no fim do ano e passou a segunda metade da temporada sem clube, num cenário que praticamente se repetiu em 2018/19, aí no Akhisarspor. Foi então que surgiu em cena o Hapoel Beer Sheva, uma força dominante em Israel (e já então capitaneado por Miguel Vítor) e um contexto favorável à demonstração de todas as qualidades do médio criativo luso, que logo na primeira época celebrou a conquista da Taça, com um golo e uma assistência na final (2-0), fazendo um total de 32 jogos e 6 golos, seguindo-se então os 13 golos e 6 assistências em 2020/21 já mencionados no início do texto – alguns de belíssimo efeito e só ao alcance de atletas com capacidade técnica superior.

Deu-se assim a possibilidade de rumar ao grande dominador do futebol polaco no último verão e Josué não enjeitou essa hipótese, até por ter também no plantel a presença dos compatriotas André Martins (entretanto já transferido… para o Hapoel Beer Sheva) e Rafael Lopes, aos quais se juntou entretanto também Yuri Ribeiro. Podia estar a correr melhor, já se percebeu; ainda assim, é factual dizer que, dentro das dificuldades colectivas, o criativo está a manter o registo a que habituou os adeptos de quase todos os clubes por onde passou e que garantidamente mantém todas as faculdades apuradíssimas. O comboio da selecção já partiu (diríamos que definitivamente, embora nunca o possamos obviamente afirmar com 100 por cento de certeza), mas é claro para todos os que semana após semana vêem os desempenhos de Josué que os seus préstimos ainda se coadunam com os de um futebolista que, no mínimo, tem de actuar numa equipa que jogue nas competições europeias – onde, já agora, ainda esta época se mostrou em pleno, fazendo a assistência para o golo que valeu a vitória do Legia sobre o Leicester na segunda jornada da fase de grupos da Liga Europa.

Os homens de Varsóvia têm agora mais oito jornadas para limpar o mais possível a má imagem deixada na temporada até ao momento e acima de tudo tentar conquistar a Taça, que talvez seja a possibilidade mais real para conseguirem garantir um lugar nas competições europeias em 2022/23. E, obviamente, contando com um super-Josué para os guiar nessa caminhada, ele que já venceu a prova em dois países diferentes, marcando em ambas as finais; e, lá diz o ditado, não há duas sem três…